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sexta-feira, 30 de março de 2012

"ANOS DE CHUMBO': A DITADURA DA MENTIRA

José Maria e Silva * *   
 
"A revolução é biófila, é criadora de vida, ainda que, para criá-la, seja obrigada a deter vidas que proíbem a vida."
Paulo Freire, em "Pedagogia do Oprimido", defendendo os fuzilamentos sumários comandados por Che Guevara e Fidel Castro
 
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Para o sociólogo e jornalista José Maria, a universidade brasileira, na ânsia de criar um novo mundo, especializou-se em destruir o existente.
     Com quantas vidas se faz uma ditadura? Na belíssima novela de John Boyne, O Menino do Pijama Listrado, essa pergunta é respondida pelo espanto de Bruno, um menino de nove anos. Sempre que ele se surpreende com o mundo do Fúria à sua volta, seus olhos se arregalam, sua boca faz o formato de um O e seus braços caem ao longo do corpo.
     A obra, uma elegia à inocência da vida que não sabe da morte, deveria ser lida — e meditada — pelos 3.949 intelectuais que, até agora, assinaram um manifesto contra a Folha de São Paulo, repudiando o editorial "Limites a Chávez", publicado em 17 de fevereiro último, no qual a ditadura militar brasileira é indiretamente chamada de "ditabranda". O Menino do Pijama Listrado (o livro, não vi o filme) demonstra, metaforicamente, a abissal diferença entre um regime autoritário (circunscrito à esfera política) e um regime totalitário (que permeia todas as instâncias sociais).
     As primeiras reações ao editorial da Folha partiram da socióloga Maria Victória Benevides, professora da Faculdade de Educação da USP, e do advogado Fábio Konder Comparato, professor aposentado pela mesma instituição. Esquecendo-se que a universidade que representam arrasta até hoje um cadáver insepulto (o do estudante de medicina morto num trote em 1999), Benevides e Comparato encenaram uma indignação que jamais sentiram diante das quase 100 mil mortes perpetradas pela Trindade Cubana (Fidel, Guevara e Raúl Castro) — 17 mil na boca dos fuzis, em execuções sumárias, e 80 mil nos dentes dos tubarões, em fuga para os Estados Unidos.
    Como a Folha de S. Paulo chamou a atenção para essa dúbia moral de Benevides e Comparato, lembrando que eles jamais protestaram contra a ditadura cubana, os dois intocáveis uspianos se sentiram feridos e, em resposta, fizeram o que os intelectuais de esquerda mais sabem fazer quando são pegos sem argumentos — conclamaram o rebanho para um manifesto.
     O inefável Antonio Candido, decano dos intelectuais de esquerda, encabeça o repúdio à Folha, que também conta com figuras como o indefectível Emir Sader, intelectual que, diante de Che Guevara, cai de joelhos por terra, parafraseando a missa: "Guevara, eu não sou digno de que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra e serei salvo". Quem duvida que Emir Sader é capaz dessa oração diante do guerrilheiro argentino, leia o que ele escreveu num artigo publicado em Carta Maior: "Não vou gastar palavras inúteis para falar do Che. Basta reproduzir algumas das suas frases, que selecionei para o livro Sem Perder a Ternura". Também diante de Marx e Fidel, Sader emudece: "O que falar de Marx que permaneça à sua altura? O que escrever sobre Fidel?"
     Se o ensino superior no Brasil, público e privado, não fosse mero aparelho ideológico da esquerda, Emir Sader jamais teria virado doutor em ciência política pela USP e professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de orientador de teses e dissertações. Sem dúvida, estaria até hoje tentando passar no vestibular e sendo reprovado sempre, por não ter argumentos para retratar personagens da história. Que universidade isenta aceitaria um aluno que, ao ouvir falar de Marx, Guevara e Fidel, não fosse capaz de articular uma só palavra e se comportasse feito os silvícolas do Anhangüera, embriagado pelo álcool incandescente da revolução? Já imaginaram se um intelectual de "direita" dissesse não ter palavras diante de Karl Popper? Seria acusado de ignorante e charlatão. Emir Sader é um paradigma da universidade brasileira. Ele é a prova cabal de que, por trás da cantilena de "produção do conhecimento", o que há nos mestrados e doutorados do país é uma usina de produção de marxismo e derivados.
     Estou plenamente convicto de que a universidade brasileira não é solução para nada — ela é parte essencial do problemaAs principais mazelas do Brasil são fomentadas artificialmente pela universidade, que, desde a década de 50, na ânsia de criar um novo mundo, especializou-se em destruir o existente. Isso fica muito claro quando se estuda a origem social dos guerrilheiros que pegaram em armas contra o regime militar. Eles vieram, em sua maioria, das universidades. Não tinham o menor apoio popular. Como é que o povo podia apoiar um bando de tresloucados que, de arma em punho, pregavam a derrubada de uma ditadura imaginária? Porque até o final de 1968, com a edição do AI-5, só havia ditadura na imaginação dos universitários.  Foi exatamente durante os propalados "Anos de Chumbo" que o Brasil viveu uma das maiores efervescências culturais de sua história, com os festivais, a imprensa alternativa, a Tropicália, o Cinema Novo, Chico e Vandré, Caetano e Gil. Ao contrário de Cuba, onde Chico Buarque seria fuzilado ou condenado a 20 anos de prisão se falasse mal de Fidel Castro, no Brasil, o máximo que lhe aconteceu foi ser admoestado pelos militares, o que lhe garante até hoje uma conta bancária maior do que seu indiscutível talento.
        Num ambiente assim, existe alguma razão plausível para se pegar em arma ou até para se perpetrarem atentados terroristas, como fizeram muitos grupos guerrilheiros? Obviamente, não. Em toda guerra, os primeiros sacrificados são os inocentes, portanto, a opção pela luta armada para derrubar um regime só se justifica quando esse regime é sanguinário e opressivo, incidindo sobre toda a vida social e não apenas sobre a esfera política. Era o que acontecia na terra do Menino do Pijama Listrado, daí o Levante do Beco de Varsóvia, em 1943, quando judeus desesperados — não tendo senão uma morte horrenda como alternativa — preferiram abreviar a vida numa luta suicida contra as tropas nazistas.
     Mas esse não era o caso do Brasil dos militares. Aqui, os guerrilheiros eram homens e mulheres bem nascidos que, por puro espírito de aventura, jogavam fora o futuro como médicos, engenheiros e advogados e se arvoravam a libertadores da pátria, sem notar que a maioria esmagadora da população — provavelmente mais de 90 por cento — não se sentia oprimida nem pedia para ser libertada. Pelo contrário, o regime instalado em 1964 teve forte apoio popular e quando começou a ser repudiado nas urnas, em 1974, com a expressiva vitória do velho MDB, esse repúdio era mais de caráter econômico que político. A inflação estava recomeçando e os pobres votaram contra a "carestia", que é como chamavam a inflação na época.
     Já escrevi repetidas vezes, mas a ocasião me obriga a escrever de novo: quem acha que no Brasil houve uma ditadura sanguinária, totalitária, nos moldes nazistas (é essa a visão que se tem dos militares nas escolas) deve ler Pedagogia do Oprimido, o panfleto de auto-ajuda marxista do pedagogo Paulo Freire. Esse livro — que faz uma defesa explícita da luta armada e santifica Che Guevara, Fidel Castro e Mao Tsé-Tung — foi publicado em pleno ano de 1970, no Rio de Janeiro, pela Editora Paz e Terra, ligada aos padres da Teologia da Libertação. Em 1981, Pedagogia do Oprimido já estava na 10ª edição. Um verdadeiro best-seller, levando em conta que não é um livro comercial e o Brasil tinha muito menos estudantes universitários do que tem hoje. Ora, se o regime militar foi o período "mais sombrio da nossa história", como dizem os intelectuais de esquerda, como se explica o sucesso editorial de uma obra que o combatia? Em Havana seria possível publicar um livro do gênero contra Fidel Castro, o santo fardado de Buarques e Sáderes?
     Mas nem é preciso recorrer à ditadura cubana para demonstrar que os intelectuais brasileiros mentem descaradamente quando dizem que o regime militar de 64 foi uma ditadura sanguinária. A própria história recente do Brasil — contada mentirosamente por eles — mostra a contradição em que incorrem. É só comparar a "Revolução de 30" com a "Ditadura Militar" (ponho as expressões entre aspas para remeter ao modo como os dois períodos costumam ser chamados nos livros de história). Qual a diferença entre os dois períodos? A rigor, nenhuma. Salvo o fato de que Getúlio Vargas era um ditador civil, obviamente apoiado por militares, porque toda ditadura precisa de armas.
     Se a sanguinária ditadura Vargas merece, nos livros de história, o epíteto de 'Revolução de 30' (justificadamente, por sinal), por que os governos militares não podem ser chamados de 'Revolução de 64', uma vez que também mudaram a face do Brasil?
     Sob o ponto de vista da repressão, Vargas foi muito pior do que os militares. O seu período, sim, foi literalmente "anos de chumbo". Enquanto os militares procuraram preservar as instituições, garantindo eleições legislativas e a independência do Judiciário, Vargas centralizou todos os poderes em suas mãos, destituindo governadores e nomeando interventores em seu lugar. São Paulo se rebelou, na chamada Revolução Constitucionalista de 32, e Vargas bombardeou o Estado — o episódio mais sangrento da história brasileira no século passado, apesar de ofuscado pela preferência dos intelectuais pela Guerrilha do Araguaia. Todavia, mesmo quem não pegava em armas, não ficava ileso. O escritor Graciliano Ramos, individualista nato, incapaz de arregimentar qualquer movimento político, acabou sendo preso durante quase um ano, num presídio comum, sem julgamento. Seu único crime: escrever o romance São Bernardo, entre outros escritos tidos como comunistas. Bem que merecia, mas não teve indenização alguma pelo arbítrio de que foi vítima. Ao contrário dos fanfarrões que pegaram em armas contra os militares, o Velho Graça tinha vergonha na cara.
     Se a sanguinária ditadura de Getúlio Vargas merece, nos livros de história, o epíteto de "Revolução de 30" (justificadamente, por sinal), por que os governos militares não podem ser chamados de "Revolução de 64", levando em conta que também mudaram a face do Brasil? Vargas já era ditador desde o início de seu governo, antes mesmo da implantação do Estado Novo, em 1937, quando a tresloucada Intentona Comunista de 35 levou ao recrudescimento do regime. Já os militares só foram verdadeiramente ditadores a partir de 12 de dezembro de 1968, quando editaram o AI-5, obrigados pelos atos de terror da esquerda armada, treinada e financiada por Fidel Castro e abençoada por intelectuais como Paulo Freire. Mesmo assim, foi uma ditadura cirúrgica, circunscrita aos inimigos declarados do regime. Tanto que não chegou a matar nem 500 pessoas, como reconhecem os próprios autores de esquerda nos balanços que fizeram do período. As vítimas inocentes, em sua maioria, tombaram por terem sido usadas como escudo pelos adversários do regime.
     Um dos argumentos de Maria Victoria Benevides para criticar o editorial da Folha é que não se mede ditadura com estatísticas: "Quando se trata de violação de direitos humanos, a medida é uma só: a dignidade de cada um e de todos, sem comparar 'importâncias' e estatísticas". Em artigo publicado, na terça-feira, 24, o jornalista Fernando de Barros e Silva, editor de Brasil da Folha, corrobora a tese da socióloga: "Algumas matam mais, outras menos, mas toda ditadura é igualmente repugnante. Devemos agora contar cadáveres para medir níveis de afabilidade ou criar algum ranking entre regimes bárbaros?" Claro que devemos — respondo eu. Todo crime só se iguala em repugnância para aquele que é sua vítima, mas para quem o analisa de fora, especialmente se esse alguém for um historiador, há uma enorme diferença entre matar 100 pessoas ou matar 100 mil. Se Hitler tivesse matado apenas uma centena de judeus, o nazismo seria a encarnação do mal no imaginário do mundo contemporâneo?
     Só não vê que ditadura também se mede com estatísticas aqueles que têm medo dos números. Ao ver que nenhuma ditadura capitalista até hoje conseguiu igualar os mais de 100 milhões de mortos do comunismo no mundo, a esquerda inventou esse argumento falacioso de que uma só morte perpetrada por uma ditadura diminui toda a humanidade, como se o homem-massa da revolução marxista tivesse lugar na poesia metafísica de John Donne. Justamente a esquerda, que não faz conta do individuo de carne e osso, só da massa de manobra da revolução. O regime militar não apenas matou muito menos gente do que outros regimes autoritários — também foi capaz de criar um modelo de ditadura que deveria ser exportado. Toda ditadura costuma ser encarnada por um homem só, que se torna escravo do poder que concentra, perdendo inclusive os freios morais. Daí a profusão de ditadores sádicos, pessoalmente sedentos de sangue humano.
     Boa parte do chamado movimento social — que hoje alimenta o PT e demais partidos de esquerda — começou a ser construído graças a esse processo de institucionalização do país gestado pelos militares. Começando pelas próprias universidades federais — cobras a quem os militares deram asas
     No Brasil isso não ocorreu. Os militares criaram uma espécie de ditadura institucional, em que o poder não era encarnado por nenhum homem, mas pela instituição — as Forças Armadas. Nem o principio federativo foi quebrado num primeiro momento, como ocorreu de imediato com a ditadura de Getúlio Vargas. Antes do recrudescimento da luta armada, ainda houve eleição para governadores e, mesmo depois que elas foram suspensas, o legislativo continuou funcionando. Essa quase normalidade institucional propiciou até o surgimento e fortalecimento de uma oposição que jamais houvera em toda a história do Brasil — a oposição institucional, criada e mantida pelas próprias entranhas do Estado.
     Boa parte do chamado movimento social — que hoje alimenta o PT e demais partidos de esquerda — começou a ser construído graças a esse processo de institucionalização do país gestado pelos militares. Começando pelas própriasuniversidades federais — cobras a quem os militares deram asasA Reforma Universitária feita pelos militares em 1968 profissionalizou o ensino superior no país, instituindo antigas reivindicações da própria comunidade acadêmica, como dedicação exclusiva de docentes, introdução de vestibular unificado e implantação de mestrados e doutorados. Valendo-se dessa estrutura, os intelectuais de esquerda se infiltraram nas universidades e, a partir delas, forjaram em todo o país um movimento social de proveta, destinado não a resolver problemas, mas a fomentá-los.
     Um exemplo são os quase 50 mil homicídios que ocorrem anualmente no país. Eles decorrem, em grande parte, da irresponsabilidade doentia dos intelectuais brasileiros, que, à força de pressionar o Congresso Nacional, levaram à completa lassidão das leis penais, hoje irreversível, já que a mentalidade pueril da esquerda parece ter contaminado até os ministros do Supremo. Não é a toa que o ministro Gilmar Mendes deixa entrever que, a qualquer momento, pode soltar nas ruas 189 mil dos cerca de 440 mil presos do país, muitos deles homicidas e estupradores. Aí, sim, teremos um verdadeiro genocídio da população indefesa, em parte porque a esquerda, com o objetivo de demonizar os militares, transformou o falacioso conceito de direitos humanos num dogma divinoComo se vê, a criminalização paranóica dos militares só atende a um objetivo — esconder que os intelectuais de esquerda forjaram um país muito pior que o deles.
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     Artigo publicado no Jornal Opção, de Goiânia, em 1º de março de 2009.
    * * José Maria e Silva. Jornalista e sociólogo, com graduação em Jornalismo (1995) e mestrado em Sociologia (2003) pela Universidade Federal de Goiás. Foi redator-chefe do Jornal Opção, de Goiânia.

quinta-feira, 29 de março de 2012

OS MILITARES E A MEMÓRIA NACIONAL


Como todos os meninos da escola na minha época, eu não podia cantar o Hino Nacional ou prestar um juramento à bandeira sem sentir que estava participando de uma pantomima. A gente ria às escondidas, fazia piadas, compunha paródias escabrosas. Os símbolos do patriotismo, para nós, eram o suprassumo da babaquice, só igualado, de longe, pelos ritos da Igreja Católica, também abundantemente ridicularizados e parodiados entre a molecada, não raro com a cumplicidade dos pais. Os professores nos repreendiam em público, mas, em segredo, participavam da gozação geral.
Cresci, entrei no jornalismo e no Partido Comunista, frequentei rodas de intelectuais. Fui parar longe da atmosfera da minha infância, mas, nesse ponto, o ambiente não mudou em nada: o desprezo, a chacota dos símbolos nacionais eram idênticos entre a gente letrada e a turminha do bairro. Na verdade, eram até piores, porque vinham reforçados pelo prestígio de atitudes cultas e esclarecidas. Graciliano Ramos, o grande Graciliano Ramos, glória do Partidão, não escrevera que o Hino era "uma estupidez"?
Mais tarde, quando conheci os EUA, levei um choque. Tudo aquilo que para nós era uma palhaçada hipócrita, os americanos levavam infinitamente a sério. Eles eram sinceramente patriotas, tinham um autêntico sentimento de pertinência, de uma raiz histórica que se prolongava nos frutos do presente, e viam os símbolos nacionais não como um convencionalismo oficial, mas como uma expressão materializada desse sentimento. E não imaginem que isso tivesse algo a ver com riqueza e bem-estar social. Mesmo pobres e discriminados se sentiam profundamente americanos, orgulhosamente americanos, e, em vez de ter raiva da pátria porque ela os tratava mal, consideravam que os seus problemas eram causados apenas por maus políticos que traíam os ideais americanos.
Correspondi-me durante anos com uma moça negra de Birmingham, Alabama. Ali não era bem o lugar para uma moça negra se sentir muito à vontade, não é mesmo? Mas se vocês vissem com que afeição, com que entusiasmo ela falava do seu país!! E não só do seu país: também da sua igreja, da sua Bíblia, do seu Jesus. Em nenhum momento a lembrança do racismo parecia macular em nada a imagem que ela tinha da sua pátria. A América não tinha culpa de nada. A América era grande, bela, generosa. A maldade de uns quantos não podia afetar isso em nada. Ouvi-la falar me matava de vergonha. Se alguém no Brasil dissesse essas coisas, seria exposto imediatamente ao ridículo, expelido do ambiente como um idiota-mor ou condenado como reacionário, um integralista, um fascista.
Só dois grupos, neste país, falavam do Brasil no tom afetuoso e confiante com que os americanos falavam da América. O primeiro eram os imigrantes: russos, húngaros, poloneses, judeus, alemães, romenos. Tinham escapado ao terror e à miséria de uma das grandes tiranias do século (alguns, das duas), e proclamavam, sem sombra de fingimento: "Este é um país abençoado!" Ouvindo-nos falar mal da nossa terra, protestavam: “Vocês são doidos”. "Não sabem o que têm nas mãos". Eles tinham visto coisas que nós não imaginávamos, mediam a vida humana numa outra escala, para nós aparentemente inacessível. Falávamos de miséria, eles respondiam: "Vocês não sabem o que é miséria". Falávamos de ditadura, eles riam: "Vocês não sabem o que é ditadura".
No começo isso me ofendia. "Eles acham que sabem tudo", dizia com meus botões. Foi preciso que eu estudasse muito, vivesse muito, viajasse muito, para entender que tinham razão, mais razão do que então eu poderia imaginar. A partir do momento em que entendi isso, tornei-me tão esquisito, para meus conterrâneos como um estoniano ou húngaro, com sua fala embrulhada e seu inexplicável entusiasmo pelo Brasil, eram então esquisitos para mim.
Digo, por exemplo, que um país onde um mendigo pode comer diariamente um frango assado por dois dólares é um país abençoado, e as pessoas querem me bater. Não imaginam o que possa ter sido sonhar com um frango na Rússia, na Alemanha, na Polônia, e alimentar-se de frangos oníricos. Elas acreditam que em Cuba os frangos dão em árvores e são propriedade pública.
Aqueles velhos imigrantes tinham razão: o brasileiro está fora do mundo, tem uma medida errada da realidade. O outro grupo onde encontrei um patriotismo autêntico foi aquele que, sem conhecê-lo, sem saber nada sobre ele, exceto o que ouvia de seus inimigos, mais temi e abominei durante duas décadas: os MILITARES. Caí no meio deles por mero acaso, por ocasião de um serviço editorial que prestava para a Odebrecht que me pôs temporariamente de editor de texto de um volumoso tratado O Exército na História do Brasil. A primeira coisa que me impressionou entre os militares foi sua preocupação sincera, quase obsessiva, com os destinos do Brasil. Eles discutiam os problemas brasileiros como quem tivesse em mãos a responsabilidade pessoal de resolvê-los. Quem os ouvisse sem saber que eram militares teriam a impressão de estar diante de candidatos em plena campanha eleitoral, lutando por seus programas de governo e esperando subir nas pesquisas junto com a aprovação pública de suas propostas.
Quando me ocorreu que nenhum daqueles homens tinha outra expectativa ou possibilidade de ascensão social senão as promoções que automaticamente lhes viriam no quadro de carreira, no cume das quais nada mais os esperava senão a metade de um salário de jornalista médio, percebi que seu interesse pelas questões nacionais era totalmente independente da busca de qualquer vantagem pessoal. Eles simplesmente eram patriotas, tinham o amor ao território, ao passado histórico, à identidade cultural, ao patrimônio do país, e consideravam que era do seu dever lutar por essas coisas, mesmo seguros de que nada ganhariam com isso senão antipatias e gozações.
Do mesmo modo, viam os símbolos nacionais - o hino, a bandeira, as armas da República - como condensações materiais dos valores que defendiam e do sentido de vida que tinham escolhido. Eles eram, enfim, "americanos" na sua maneira de amar a pátria sem inibições.
Procurando explicar as razões desse fenômeno, o próprio texto no qual vinha trabalhando me forneceu uma pista. O Brasil nascera como entendida histórica na Batalha dos Guararapes, expandira-se e consolidara sua unidade territorial ao sabor de campanhas militares e alcançara pela primeira vez, um sentimento de unidade auto-consciente por ocasião da Guerra do Paraguai, uma onda de entusiasmo patriótico hoje dificilmente imaginável.
Ora, que é o amor à pátria, quando autêntico e não convencional, senão a recordação de uma epopéia vivida em comum? Na sociedade civil, a memória dos feitos históricos perdera-se, dissolvida sob o impacto de revoluções e golpes de Estado, das modernizações desaculturantes, das modas avassaladoras, da imigração, das revoluções psicológicas introduzidas pela mídia. Só os militares, por força da continuidade imutável das suas instituições e do seu modo de existência, haviam conservado a memória viva da construção nacional. O que para os outros eram datas e nomes em livros didáticos de uma chatice sem par, para eles era a sua própria história, a herança de lutas, sofrimentos e vitórias compartilhadas, o terreno de onde brotava o sentido de suas vidas.
O sentimento de "Brasil", que para os outros era uma excitação epidérmica somente renovada por ocasião do carnaval ou de jogos de futebol (e já houve até quem pretendesse construir sobre essa base lúdica um grotesco simulacro de identidade nacional), era para eles o alimento diário, a consciência permanentemente renovada dos elos entre passado, presente e futuro.
Só os militares eram patriotas porque só os militares tinham consciência da história da pátria como sua história pessoal. Daí também outra diferença. A sociedade civil, desconjuntada e atomizada, é anormalmente vulnerável a mutações psicológicas que induzidas do Exterior ou forçadas por grupos de ambiciosos intelectuais ativistas apagam do dia para a noite a memória dos acontecimentos históricos e falseiam por completo a sua imagem do passado. De uma geração para outra, os registros desaparecem, o rosto dos personagens é alterado, o sentido todo do conjunto se perde para ser substituído, do dia para a noite, pela fantasia inventada que se adapte melhor aos novos padrões de verossimilhança impostos pela repetição de slogans e frases-feitas.
Toda a diferença entre o que se lê hoje na mídia sobre o regime militar e os fatos revelados no site do TERNUMA (Terrorismo Nunca Mais) vem disso.
Até o começo da década de 80, nenhum brasileiro, por mais esquerdista que fosse, ignorava que havia uma revolução comunista em curso, que essa revolução sempre tivera respaldo estratégico e financeiro de Cuba e da URSS, que ele havia atravessado maus bocados em 1964 e tentara se rearticular mediante as guerrilhas, sendo novamente derrotada.
Mesmo o mais hipócrita dos comunistas, discursando em favor da "democracia", sabia perfeitamente a nuance discretamente subentendida nessa palavra, isto é, sabia que não lutava por DEMOCRACIA NENHUMA, mas pelo comunismo cubano e soviético, segundo as diretrizes da Conferência Tricontinental de Havana. Passada uma geração, tudo isso se apagou.
A juventude, hoje, acredita piamente que não havia revolução comunista nenhuma, que o governo João Goulart era apenas um governo normal eleito constitucionalmente, que os terroristas da década de 70 eram patriotas brasileiros lutando pela liberdade e pela democracia.
No Brasil, a multidão não tem memória própria. Sua vida é muito descontínua, cortada por súbitas mutações modernizadoras, não compensadas por nenhum daqueles fatores de continuidade que preservava a identidade histórica do meio militar. Não há cultura doméstica, tradições nacionais, símbolos de continuidade familiar. A memória coletiva está inteiramente a mercê de duas forças estranhas: a mídia e o sistema nacional de ensino. Quem dominar esses dois canais mudará o passado, falseará o presente e colocará o povo no rumo de um futuro fictício. Por isso o site "TERNUMA" é algo mais que a reconstituição de detalhes omitidos pela mídia. É uma contribuição preciosa à reconquista da verdadeira perspectiva histórica de conjunto, roubada da memória brasileira por manipuladores maquiavélicos, oportunistas levianos e tagarelas sem consciência.
Perguntam-me se essa contribuição vem dos militares? Bem, de quem mais poderia vir?

Olavo de Carvalho - Filósofo e Cientista Político

segunda-feira, 26 de março de 2012

Procuradora militar diz que obras do Exército em Guarulhos são exemplo.


LUIZ ROIZ
A procuradora-geral da Justiça Militar, Cláudia Márcia Ramalho Moreira Luz, visitou ontem as obras militares no Aeroporto de Guarulhos e, ao final de uma vistoria de três horas, disse que elas “são motivo de orgulho, não só para o Exército mas para todo o Brasil”.
Ela ficou especialmente impressionada como fato de a equipe do “Destacamento Guarulhos” não apenas ter concluído a maior parte das obras antes do prazo, mas tê-las realizado com menos recursos do que os previstos em orçamento – cerca de 35% a menos, o que representou uma economia para os cofres públicos de R$ 150 milhões.
“Está havendo devolução de dinheiro público, isso é uma coisa formidável”, disse a procuradora, em entrevista exclusiva ao DG. “É a primeira vez que eu vejo isso.”
Segundo ela, o papel do Ministério Público Militar não é apenas apontar e punir eventuais erros de militares, “mas também aplaudir o que está certo”.
“Vim até aqui para verificar in loco as obras e dar um testemunho, para que este exemplo se espalhe”, disse.
Informou que fará um relatório a respeito do que viu e o encaminhará ao comandante do Exército, general Enzo Peri.
As obras em questão são duas: a reforma da pista principal de 3.700 m por 45 m de largura, que já foi concluída entregue em dezembro (antes do prazo); e a terraplenagem e preparação do pátio de aeronaves do futuro Terminal Três do Aeroporto, numa área de 300 mil m2.
A obra do pátio deverá ficar pronta até o início do próximo ano, com seis meses de antecedência, segundo o coronel Carlos Alberto Maciel Teixeira, comandante da equipe militar (hoje, 80 pessoas) que coordena a operação, em conjunto com empreiteiras civis.
As duas obras estavam orçadas, inicialmente, em R$ 430 milhões; ao final, deverão custar cerca de R$ 280 milhões.
A procuradora foi recebida no Aeroporto, nesta quinta, 22, pelo general de brigada Wagner Oliveira Gonçalves, diretor de Obras de Cooperação do Departamento de Engenharia do Exército, e pelo tenente-coronel Carlos Alberto Maciel Teixeira, comandante da equipe de soldados e oficiais que toca as obras militares em Guarulhos.
Ela é procuradora há 17 anos e está concluindo (em abril) seu segundo mandato como chefe do Ministério Público Militar. Antes, foi promotora de justiça do Rio de Janeiro, seu estado de origem.

sexta-feira, 23 de março de 2012

QUEM DEU O 1º TIRO?

Acredito que alguns setores das esquerdas brasileiras subestimaram a capacidade dos militares da Reserva de reagirem contra o estado de coisas por que passa o País.
Era de se esperar que parte da “Intelligentsia” nacional fosse, no mínimo, mais inteligente, ou menos parcial. 
O jornal Estado SP - 06 Mar 12, faz referência a um manifesto de cineastas brasileiros no qual, entre outras coisas, repudiam as recentes declarações de militares, com destaque para a inquietação de oficiais da reserva, com relação à Comissão da Verdade.
Em meio àqueles surrados chavões esquerdistas, o manifesto diz que os diretores de cinema repudiam os ataques "desses setores minoritários das  FFAA" que, de forma alguma, poderão obstruir as investigações que deverão ser iniciadas o quanto antes (destaco: o quanto antes...).
Diz, ainda:

"... estaremos atentos para que tal comissão seja composta por pessoas comprometidas com a democracia e com a verdade".

Gostaria inicialmente, com a devida vênia, de levar ao conhecimento dos senhores diretores de cinema que nas FFAA não existem "setores minoritários", embora seja isso o que muita gente queira fazer parecer.
O "setor minoritário" a que os senhores fazem referência, nada mais é do que a Reserva militar mobilizável do Brasil.
Um dia, os integrantes dessa Reserva estiveram no serviço ativo.
E foi nessa época que viveram/presenciaram/construíram outra parte da verdade que agora, por ser extremamente oportuno, eles querem que seja esclarecida também.
Os militares que combateram a subversão/guerrilha/terrorismo não formavam uma milícia de loucos desgovernados que combatiam de forma acéfala.

Eles formavam uma Organização Militar (OM), normalmente de pequeno efetivo, mas legalmente constituída por leis-atos-diretrizes específicas.
Esses militares, hoje na Reserva, não eram um grupo de facínoras.

Eles compunham uma força lutando por ordem do Estado contra uma força, completamente irregular, cujas principais armas eram a surpresa-traição.

O que cabia a esses militares era, duma forma ou de outra, vencer a parte que lhes opunha resistência de armas na mão. O que foi feito. E bem. 
 
Guerrilha... subversão... terrorismo... muito mais do que temas para filmes, foram coisas que existiram no "mundo real".
E causaram muitos danos à população brasileira, essa mesma que no seu manifesto os diretores de cinema querem jogar contra os militares da Reserva.
Mas, isso já é assunto por demais sabido e comentado.
Talvez seja o caso de lembrar aos senhores diretores de cinema que muitos de seus filmes não teriam enredo se não fosse o papel, ainda que estereotipado, que sempre reservaram para os militares.
Iniciamos com um "campeão de bilheteria" :

"O que é isso companheiro...".
Há como dizer, de sã consciência, que esse filme, que retrata as articulações de associações criminosas para o cometimento de um crime... ou planejar-executar um sequestro, mantendo a vítima em cárcere privado por dias e, assim, submeter sua família à tortura, não pode ser considerado como um crime...
Tomemos "Lamarca".

Não obstante todo o engajamento ideológico de seu diretor-ator principal, não é possível, à luz da lógica, negar o fato de Lamarca ter sido um traidor/desertor/ladrão e, por isso, ter sido buscado pelos militares Brasil afora...


Vejamos "Hércules 56".
Por acaso não trata o filme duma reunião, na vida real, de pessoas que cometeram todos os tipos de crimes como assaltos/mortes/sequestros de pessoas... e que no filme revelam suas verdadeiras ações-intenções da época... O filme  retrata verdadeira reunião festiva para relembrar uma pretérita associação para o crime...

Quem sabe... "Batismo de Sangue"...
Por mais que se tornem os padres adeptos da luta armada em "anjos" e "mártires", não há como negar que seu "guia espiritual" era Marighella, líder de organização criminosa/autor dum opúsculo denominado 
"Mini manual do Guerrilheiro Urbano".

Se observarmos "Araguaia. Conspiração do Silêncio", o subversivo "Oswaldo" que ali é retratado não parece um semideus descido do Olimpo diretamente pra selva amazônica... só que o diretor esqueceu de mostrar os crimes que ele cometeu e, levou seu grupo a cometer.
Esse senhor chegou a negar aos militares uma trégua para que retirasse do campo de batalha o corpo de um soldado morto por ele.
Quando se conseguiu recolher o corpo, pouco restava, senão a parte protegida pelo calçado.

Então senhores diretores de cinema do Brasil, não seria a Comissão da Verdade uma excelente oportunidade para, como em um filme, estabelecer-se quem deu o 1° tiro... quem detonou a primeira bomba... quem fez as primeiras vítimas... quem assaltou bancos/carros-fortes/trens... quem matou/aleijou pessoas inocentes, algumas delas mortas com extrema violência, tomando-as como simples efeitos colaterais... o que foi feito dos milhões roubados... como se negociaram as armas que Lamarca roubou... por que treinar em Cuba/Coreia Norte/e outros países que se destacam por suas "democracias"... Tudo isso daria bons filmes.
Caso os diretores de cinema, como dizem no seu manifesto, estivessem cuidando da memória nacional, como poderiam não ser a favor de uma comissão da verdade que ouvisse ambos os lados... Para o bem da cinematografia nacional, seria bom, e a sociedade agradeceria, se os senhores ajudassem a mostrar o outro lado.

Seriam mais filmes... embora, devo admitir, o patrocínio viria a ser mais difícil.
É bem como disse no manifesto a Sra. Lúcia Murat :

"Se a gente, a sociedade civil, que é maioria, não defender nosso direito de conhecer a história do Brasil, quem vai..."

Caso a senhora permita, posso dar uma resposta :
- Por incrível que pareça, serão os militares da Reserva e um significativo número de civis que concordam com eles, que a ajudarão. Pois, ao que parece, são os únicos a querer ver a História do Brasil completamente contada.
 
Jorge Alberto Forrer Garcia
Cel Reformado
Curitiba/PR

Ficha limpa e soberania popular

Carlos Moura *

Brasília, 15/03/2012 - O artigo é de autoria do Diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, Carlos Alves Moura, e foi publicado na segunda-feira (12) no Correio Braziliense.
Em tempo de difíceis manifestações de apreço aos valores éticos e morais, especialmente na esfera política, acabamos de assistir à plena validade da Lei nº 135, denominada Lei da Ficha Limpa. Proposta nascida da sociedade civil, conforme o prescrito na Constituição Federal, foi aprovada no Congresso Nacional e sancionada e chancelada pelo Supremo Tribunal Federal. Trata-se de episódio que nos instiga a reflexões: a soberania popular impõe-se quando a sociedade organizada intervém na sistemática do poder; os instrumentos legais do exercício da cidadania, se utilizados com soberania, produzem benéficos resultados, no momento em que a tradicional democracia representativa claudica. Tornam-se necessários gestos capazes de legitimarem a democracia direta, mediante a adoção de mecanismos de poder forjados no seio da população.
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), integrado por mais de 40 entidades da sociedade civil — dentre as quais a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Ordem dos Advogados do Brasil —, ao decidir prestar um serviço ao país, no sentido do aprimoramento do processo eleitoral procurou uma temática palatável a todos. Ou seja, impedir candidaturas de brasileiros com vida pregressa em descompasso com as boas normas de convivência comunitária e em desalinho com os postulados legais. Entende-se que o postulante a quaisquer cargos mediante sufrágio há de exibir a sua ficha limpa. E mais: se limpa quanto às prerrogativas emanadas das leis, limpa, também, no que se refere à prática de bem servir à comunidade. Ao pleitear votos, o candidato só é legítimo se tem provada sua vocação para o bem comum: trabalhos em prol da sociedade.
A Campanha da Ficha Limpa tornou possível aos que não possuem intimidade com o direito conhecerem e entenderem expressões, até então cativas dos saberes de quem exerce funções atinentes aos temas jurídicos: presunção de inocência, retroatividade das leis, elegibilidade e inelegibilidade, plebiscito, referendo, iniciativa e soberania popular, prescrição, democracia representativa, direito adquirido, segurança jurídica, além de outras. Possibilitou à sociedade conhecer a Justiça Eleitoral, sua composição, funcionamento e prerrogativas. Concorreu para que houvesse o início de uma aproximação entre o Judiciário e a população, essa em busca de compreender os meandros judicantes e na esfera — no caso da Ficha Limpa—de um despacho favorável. A Lei complementar nº 135 tem, ainda, o poder de contribuir para a educação política de todos. A sociedade participou do processo do início ao fim atenta às tramitações no Congresso e aos julgamentos na esfera judicial. Para tanto, destaca-se o apoio da imprensa em geral, ontem e sempre.
Democracia e participação popular são anéis de uma mesma corrente. Há 10 anos entrou em vigor a Lei 9.840. Testada nos pleitos anteriores, produziu efeitos benéficos posto que inúmeros candidatos tiveram o seu registro anulado em vista de sentença judicial e perderam mandatos. As Leis 9.840 e 135 —frutos de iniciativa popular— causam verdadeira resolução no arcabouço jurídico eleitoral e levam o eleitor a escolher com rigor o ente que pleiteia o sagrado voto. O processo de educação política implica, ainda, o eleitor tornar-se fiscal das atividades do eleito no Legislativo ou no Executivo. Cabe ao eleitor uma atitude vigilante quanto às ações daquele que recebeu uma procuração para representá-lo. Não basta observar o desempenho, mas propor atividades e soluções para eventuais problemas que possam existir em desfavor da sociedade.
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral está ciente de que cumpriu com o seu papel e estuda outras medidas destinadas ao aprimoramento da democracia em benefício dos cidadãos. Espera-se uma reforma política ampla, que possa atingir os três poderes, na perspectiva de crescente valorização do desempenho de atividades públicas que sejam republicanas. O bom desenvolvimento econômico do Estado deve sempre pôr-se a serviço de todos os brasileiros, com ênfase nos mais empobrecidos e discriminados.

* Diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.

A INTERVENÇÃO VERMELHA NO DF.


Nesta 2ª feira, 19 de março, toma posse o novo governador do Distrito Federal Swedenberger Barbosa, braço direito da presidente Dilma Rousseff e do ex-presidente Lula. O estopim foi a Operação Monte Carlo, onde o PT de Brasília aparece em maior destaque do que o objetivo do Palácio do Planalto em atingir a oposição liderada por Demostenes Torres (DEM-GO) e Marconi Perillo (PSDB-GO). O Palácio do Planalto sinalizou através do ministro Gilberto Carvalho que entregaria Agnelo Queiroz à própria sorte. Mas a estratégia do PT comandada por José Dirceu foi a de nomear o interventor, na tentativa de estancar a sangria que Agnelo, vem provocando na Capital da República desde a posse no início de 2011.
O Grupo Delta Engenharia, considerado hoje o maior fornecedor do Governo Federal, foi atingido em cheio pela Monte Carlo, por suas operações de propina com o GDF e o Governo de Goiás. O contraventor Carlos de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e o diretor da Delta Engenharia no Centro Oeste, Cláudio Abreu, tinham uma sociedade em Brasília e em Goiás. Carlinhos despachava numa sala onde funciona a empreiteira com outros negócios, inclusive locadora de veículos, flagrados pelo Ministério Público Federal.
As investigações em que aparece o GDF estão guardadas a sete chaves pelo procurador geral Roberto Gurgel. Ali aparecem envolvimentos de parlamentares distritais, empresários de Brasília chegando a alcançar a porta do Palácio do Planalto. Diante disso, Gilberto Carvalho, que hoje é o verdadeiro porta-voz político de Dilma, resolveu atender a estratégia colocada por José Dirceu.
Berger assume tirando todos os poderes do secretário de Governo Paulo Tadeu, do vice-governador Tadeu Filipelli, e colocando o governador Agnelo na sombra, funcionando apenas como porta-voz das decisões do Planalto. Sem o poder de governador, Agnelo começa a contagem regressiva para que a Justiça seja feita em seus processos de envolvimento com corrupção desde a época em esteve à frente do Ministério do Esporte.
O soldado quatro estrelas João Dias, que acumulou os segredos das mazelas de Agnelo em sua trajetória politica, entregou à Justiça um dossiê e assiste com total segurança o momento em que será deflagrado o novo escândalo no GDF.
O Palácio do Planalto na tentativa de minimizar o impacto de um novo escândalo, não vai conseguir apagar todos os rastros deixados por Agnelo e sua turma. Nos próximos dias, Paulo Tadeu, que tem um mandato de deputado federal, retorna ao Congresso. Rafael Barbosa, secretário de Saúde, também deixará o Governo. O vice-governador Tadeu Filipelli sairá pela porta dos fundos do Buriti para assumir o Ministério dos Transportes, numa manobra do vice-presidente Michel Temer. O resultado desta dança de cadeiras é um novo Governo no Distrito Federal.
O Ministério Público é o principal colaborador deste projeto de Dilma, guardando na gaveta o que poderia ser o segundo maior escândalo da história da Capital Federal, que nos últimos quatro vivencia momentos de degradação da cidade por péssima ingerência, mergulhada em denúncias que baixam a estima da população.
Berger é considerado homem de Lula e Zé Dirceu. Este último esteve recentemente em Brasília para prestar solidariedade a Agnelo, bombardeado diariamente com as denúncias de corrupção durante toda a sua vida política.
O MPF deixou vazar parte do inquérito da Operação Monte Carlo que alcançava o senador Demóstenes Torres, numa relação de amizade com Carlinhos Cachoeira, e o Governador de Goiás Marconi Perillo. Mas, em Brasília, Cachoeira operava com a indústria farmacêutica, lixo e lixo hospitalar, locadora de veículos, segurança e um forte esquema de contravenção de onde saem os pagamentos de propina para funcionários públicos.
Cachoeira tem como tentáculos Idalberto Matias de Araújo, o Dadá, Claudio Abreu, da Delta Engenharia, e outro amigo conhecido como Lenine. Os três são considerados pelo MP os articuladores da organização criminosa no DF.
A Delta Engenharia tem um vasto currículo de escândalos. No Governo do Rio de Janeiro foram mais de R$ 600 milhões sem licitação com a ajuda de Sérgio Cabral. Em Goiás, o governador Marconi Perillo é o padrinho da Delta. E no Governo Federal quem abre as portas para as transações é o ex-chefe da Casa Civil e deputado cassado do Mensalão José Dirceu.
Foi no Governo do PT que a Delta alçou seu grande voo. O presidente Fernando Cavendish declarou que é fácil abocanhar grandes obras: “é só comprar um senador que as coisas acontecem. Escolhe a obra que quer, paga para o senador, e ele se encarrega do jeitinho com o Governo.”
Esta declaração em qualquer país do mundo seria motivo para prisão sumária. A Revista Veja tem a gravação de Cavendish bravateando e colocando preço nos parlamentares do Congresso Nacional.
A Operação Monte Carlo revela ainda o chefe de Gabinete de Agnelo Queiroz, Claudio Monteiro, o Buchinho, operando em parceria com o Dadá na coleta de propina com a contravenção instalada em Brasília.
Monteiro usava até celular internacional para se comunicar com o Dadá e fugir do grampo oficial da Polícia Federal. Mas num descuido foi flagrado operando e deixou brecha para que Agnelo fosse visualizado na investigação.
Outro que ajudou a visualizar o Governador nas investigações do MP, na escuta autorizada pela justiça, foi Marcello de Oliveira Lopes. O agente de polícia matrícula 43280-6, citado no inquérito como Marcelão, abocanhou através da Agência Plá de Comunicação e Publicidade dois contratos milionários com a ajuda do chefe de gabinete do governador Cláudio Monteiro: um na Terracap e outro na CEB. Marcelão foi nomeado no último dia 16 de fevereiro, para um CNE 07, na Subsecretaria de Assessoramento Especial da Casa Militar, ao lado do Coronel Leão. Marcelão, flagrado nas investigações colocando Dadá e Claudio Monteiro para abrirem portas do GDF para a Agência Plá, faz parte com esses dois de um esquema de arapongagem em cima dos classificados por eles mesmos de inimigos do Governo Agnelo. Usam grampos, quebram sigilos de contas de telefone e e-mails, para se cacifarem com o governador e conseguirem emplacar seus negócios. Dadá era frequentador assíduo da Agência Plá e recebia propina de Marcelão.
Carlinhos Cachoeira é dono de laboratório em Goiás, e entrou em parceria com a União Química, velha conhecida de Agnelo Queiroz, no caso Daniel Tavares que acusou o Govenador de receber propina do Laboratório, na produção e venda de Genéricos para o Governo.
Num país cansado de tantos escândalos, a população de Brasília demonstra que não aguenta mais. O Palácio do Planalto tomou essas medidas, porque em menos de três anos a Capital da República teve quatro governantes e está à beira do quinto. A intervenção vermelha do PT sai exatamente no instante em que o Fantástico da noite deste domingo, 18, revelou ao país, práticas de corrupção muito conhecidas do brasiliense. O sentimento da população candanga, nesta segunda-feira, é de desabafo, pois o escândalo mostrado em rede nacional pela TV aconteceu no Rio de Janeiro, e não em Brasília, mas flagrou empresas que operam também no Planalto Central e a maneira como os saqueadores dos cofres públicos agem sem qualquer escrúpulo, falando de ética no mercado.
Que mercado é esse, o da corrupção? A falta de vergonha é tanta que se estivéssemos, por exemplo, no Japão não haveria adagas para tanto haraquiri.
Segunda-Feira, 19 de Março de 2012


Claudio Bernardes

terça-feira, 20 de março de 2012

O Silêncio do PT

*Coluna de Aécio Neves, nesta segunda, na Folha de São Paulo, intitulada "O silêncio do PT".
 *Já passa da hora de vermos a questão cubana além do limite da ótica ideológica. É visível o incômodo de setores, que se dizem democráticos, de reconhecer o autoritarismo do regime cubano, como se existissem duas Cubas: a real, que muitos preferem não enxergar, e a outra, da fantasia, que cada um constrói no seu imaginário como quer. Não podemos mais ver o país e o regime dinástico dos irmãos Castro como se a ilha fosse o último enclave da Guerra Fria. Precisamos, isso sim, mobilizar as melhores energias da nossa diplomacia e da comunidade internacional na direção da única realidade que, de fato, interessa: o povo cubano. *
 *São 11,2 milhões de pessoas submetidas ao cotidiano cruelmente caricato das cotas de alimentos, esse malfadado regime das cadernetas, a uma carência crônica, ao desabastecimento histórico, que desmentem, há muito, a fantasia do socialismo igualitário. Ao mal-estar econômico agrega-se o pior que uma sociedade pode vivenciar: a falta de horizonte para as novas gerações. A imensa maioria da população nasceu pós-Fidel e, portanto, desconhece o usufruto da palavra liberdade, o direito de ir e vir, de discutir, de recusar, de dissentir. "Me sinto como um refém sequestrado por alguém que não escuta nem dá explicações", diz a blogueira Yoani Sánchez, proibida pela 19ª vez de viajar a outros países. *
*No entanto nem mesmo o isolamento forçado tem conseguido impedir que,  pelas frestas da fortaleza do castrismo, infiltre-se a brisa que dá notícia aos cubanos da mais simples equação da vida política de uma nação: não há dignidade possível numa ditadura. Recordo o ainda nebuloso episódio do asilo-não-asilo aos boxeadores cubanos durante os Jogos Panamericanos do Rio, em 2007. Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara abandonaram a delegação, mas foram recambiados a Cuba pelo governo do PT. Lá os atletas sofreram retaliações. E pensar que o Brasil é tão pródigo em acolher até mesmo criminosos comuns *
 *Os silêncios e os temas evitados na viagem da presidente Dilma a Cuba agridem as consciências democráticas. O mal disfarçado flerte com regimes fechados e totalitários, como o de Cuba e o do Irã, entre outros, expõe publicamente a tentação autoritária que o PT tenta dissimular e que, no entanto, parece estar inscrito no DNA do partido. A ambiguidade explode em episódios como este. Quem no passado foi perseguida por defender ideias, deveria identificar-se com os perseguidos de hoje, e não sentir-se tão confortavelmente à vontade ao lado de dirigentes de um país onde não há resíduo de democracia há mais de meio século. Volto a Yoani: "Dilma foi a Cuba com a carteira aberta e os olhos fechados". Foi pouco.*
Obs: Por que ainda não admitimos que o objetivo do PT é implantar o comunismo no Brasil?Será que alguém acredita nas convicções democráticas da Presidenta?