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quinta-feira, 31 de maio de 2012

Criação coletiva

29 de maio de 2012 | 3h 06
Dora Kramer - O Estado de S.Paulo
Não, o ex-presidente Lula não perdeu o juízo como sugere em princípio o relato da pressão explícita sobre ministros do Supremo Tribunal Federal para influir no julgamento do mensalão, em particular da conversa com o ministro Gilmar Mendes eivada de impropriedades por parte de todas as partes.
Lula não está fora de si. Está, isto sim, cada vez mais senhor de si. Investido no figurino do personagem autorizado a desrespeitar tudo e todos no cumprimento de suas vontades.
E por que o faz? Porque sente que pode. E pode mesmo porque deixam que faça. A exacerbação desse rude atrevimento é fruto de criação coletiva e não surgiu da noite para o dia.
A obra vem sendo construída gradativamente no terreno da permissividade geral onde se assentam fatores diversos e interesses múltiplos, cuja conjugação conferiu a Lula o diploma de inimputável no qual ele se encontra em pleno usufruto.
Nesse último e bastante assombroso caso, produto direto da condescendência institucional - para dizer de modo leve - de dois ex-presidentes da Corte guardiã da Constituição: o advogado Nelson Jobim, que convidou, e o ministro Gilmar Mendes, que aceitou ir ao encontro do ex-presidente.
Nenhum dos dois dispõe da prerrogativa da inocência. Podiam até não imaginar que Lula chegaria ao ponto da desfaçatez extrema de explicitar a intenção de influir no processo, aconselhando o tribunal a adiar o julgamento e ainda insinuar oferta de "proteção" ao ministro.
Inverossímil é que não desconfiassem da motivação do ex-presidente que anunciou disposição de se dedicar diuturnamente ao desmonte da "farsa do mensalão" e provou isso ao alimentar a criação de uma comissão parlamentar de inquérito no intuito de embaralhar as cartas e embananar o jogo.
Mas, apenas para raciocinar aceitemos o pressuposto da ingenuidade, compremos a versão do encontro entre amigos e consideremos natural tanto o convite quanto a anuência.
À primeira questão posta - "é inconveniente julgar esse processo agora" -, à primeira pergunta feita pelo ex-presidente - "não tem como adiar o julgamento?" -, se o ministro Gilmar Mendes tivesse agradecido ao convite e polidamente se retirado, não teria ouvido o que viria a seguir, segundo o relato que fez depois ao presidente do STF, ao procurador-geral da República e ao advogado-geral da União.
Narrativa esta que se pressupõe verdadeira. Se aceitarmos a versão do desmentido apresentada por Nelson Jobim teremos de aceitar a existência de um caluniador com assento no Supremo Tribunal Federal e de esperar contra ele algum tipo de interpelação.
Tivesse dado por encerrado o encontro logo de início, o ministro Gilmar Mendes não teria ficado "perplexo com o comportamento e as insinuações despropositadas do presidente Lula".
Não teria ouvido alusões ao seu possível envolvimento com o esquema Cachoeira - razão da oferta de proteção na CPMI -, não teria escutado o ex-presidente chamar o ministro Joaquim Barbosa de "complexado".

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Obstrução de Justiça

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem de fazer imediatamente uma reunião administrativa, dar consequência ao julgamento do mensalão, oferecer a ajuda que se fizer necessária ao ministro Ricardo Lewandowski — um dos que já foram assediados por Luiz Inácio Lula da Silva — e emitir um “Comunicado à Nação” rechaçando a tentativa do ex-presidente de chantagear, intimidar e constranger os ministros da corte suprema do país. Ou o tribunal se dá conta da gravidade do ato e do momento ou corre o risco de se desmoralizar.
Os jornalistas de política de Brasília não podem nem devem quebrar o sigilo de suas fontes, mas também eles têm uma obrigação institucional, com a democracia: revelar que sabiam, praticamente todos eles, do assédio que Lula fazia a ministros do STF. A história estava em rodas de conversa, em todos os cafezinhos, em todos os jantares, em todos os bares. O que não se tinha era a prova ou alguém que decidisse quebrar o silêncio, a exemplo de Gilmar Mendes. O ministro fez bem em comparecer ao encontro. Fez bem em ouvir o que ouviu. Fez bem em advertir o presidente do Supremo, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União. Fez bem, finalmente, em confirmar a história que VEJA apurou e falar tudo às claras.
Ok, vá lá… Se Nelson Jobim nega que a história tenha acontecido, a imprensa tem de registrar. Mas há de buscar uma forma — como fez o repórter Jorge Moreno, de O Globo, de circunstanciar o desmentido — que, no seu texto, vale por uma confirmação. Afinal, se Jobim tivesse endossado a acusação de Mendes, ninguém menos do que o grande Lula estaria lascado. Aquilo a que se assistiu na sala do ex-ministro do STF e ex-ministro de Lula chama-se, entre outras coisas, “obstrução de justiça”, o que pode render, em caso de condenação, de um a quatro anos de cadeia, segundo o que caracteriza e prevê o Artigo 344 do Código Penal, a saber:

“Usar de violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo judicial, policial ou administrativo, ou em juízo arbitral: Pena — reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

Única saída

Reflitam um pouco: a única saída que tem Lula é a negativa de Jobim. Sem ela, estaria obrigado, nesta segunda, a vir a público para, mais uma vez, pedir desculpas à nação — a exemplo do que fizera em 2005, quando estourou o escândalo do mensalão. Lula, na sua ousadia tresloucada, ficou, se vocês perceberem, nas mãos de Jobim. Assim, vivemos essa realidade algo surrealista: Jobim nega, ninguém acredita, mas isso impede o agravamento da crise — ou, pensando bem, impede que a situação beire o insustentável. Não restaria outro caminho que não processar o ex-presidente da República.
O Supremo não pode se contentar com o que seria, então, uma mera guerra de versões e deixar tudo por isso mesmo. Até porque, reitero, É DE CONHECIMENTO DE CADA JORNALISTA DE BRASÍLIA A MOVIMENTAÇÃO DE LULA. Todos sabem que ele vem assediando os membros do STF. Nem mesmo o esconde. Os nomeados por ele próprio ou por Dilma, segundo seu discurso boquirroto, lhe deveriam obrigações — e não posso crer, escrevo sem cinismo nenhum, que ministros e ministras a tanto se prestem. Os que não nomeou estariam sujeitos a outra abordagem, como foi o caso de Gilmar, que assistiu àquilo que os dicionários definem como “chantagem”.
É chegada a hora de o Supremo Tribunal Federal deixar claro que não passarão. E tem de fazê-lo hoje. 

Texto publicado originalmente às 4h02
Por Reinaldo Azevedo

STF não é Sindicato!

BRASÍLIA - Nem Lula, nem Nelson Jobim, nem Gilmar Mendes desmentem que houve um encontro entre eles, no dia citado pela "Veja" e no escritório de Jobim. Esses são os fatos, o resto são versões e especulações. A elas.
Jobim foi ministro de Lula e é (pelo menos era até sexta-feira passada) amigo pessoal de Gilmar. Logo, um mediador perfeito para uma conversa espinhosa entre os dois, dessas que jamais podem sair na imprensa, mas vivem saindo. Seria muita cara de pau dizer que o encontro foi mera coincidência.
Gilmar vive às turras com o PT de Lula, e Lula não gosta de ninguém que não o endeuse. Gilmar e Lula não marcariam de se encontrar no escritório de Jobim só para bater um papo, tomar uma cerveja e comer amendoim. Nem para falar de flores.
Já que tratamos aqui de especulações, vamos pensar: falaram, então, do clima seco de Brasília? Da Rio+20? Do Corinthians na Libertadores? Do sucesso de Dilma? Ou, ao contrário, do novo "pibinho" de menos de 3% que se anuncia para 2012?
Afora o Corinthians, não consta que Lula esteja dando muita bola para nenhuma dessas coisas. Dizem -não os adversários, mas os fiéis seguidores- que ele só age pensando naquilo: eleição de São Paulo, CPI do Cachoeira e... mensalão. Questões, aliás, bastante intrincadas entre elas.
Logo, "se non é vero, é bene trovato" que Lula ande à cata de ministros do Supremo para adiar o julgamento do mensalão em ano eleitoral e tente usar a CPI como moeda de troca. Como também soa quase natural, até pela personalidade, Gilmar botar a boca no trombone.
Tudo faz tanto sentido que os demais ministros compraram rapidamente a história e reagiram com firmeza. O decano Celso de Mello acusa ingerência entre Poderes e Marco Aurélio Mello dá um basta: "O Supremo não é sindicato!".
Pode não ser, mas há quem trate o país como um grande sindicato

terça-feira, 29 de maio de 2012

Comissão da Verdade: transformação, intelectuais e estadistas

O Estado de São Paulo
Sr. (Sra.) Redator (a)
Na semana que passou, constatei que o Estadão, que tenho lido nos últimos 40 anos, deu extensa cobertura ao assunto Comissão da Verdade. Ao que foi apresentado no editorial principal, foram agregadas opiniões de um vasta gama de personagens importantes da intelligentsia brasileira.
Tento modestamente colocar algumas questões que não foram mencionadas pelas pessoas notáveis que emprestaram seus talentos para abordar o problema.
Quando se analisa qualquer país que, em algum momento da história, tenha desempenhado ou esteja desempenhando o papel de ator global, verifica-se a prevalência de três condicionantes: a ocorrência de trauma social, cultural, político e militar generalizado, caracterizador de ponto de inflexão da história da nação; a existência de intelectual ou conjunto de intelectuais, identificador e definidor dos rumos dos respectivos país e sociedade; e a existência de estadistas, capazes de catalisar as energias e sinergias à luz das indicações da intelectualidade --- não raro, no aproveitamento do êxito resultante do mencionado trauma ---, para empreender a transformação que leva o país à atuação global.
Ao se enfocar as metas incluídas no contexto da Comissão da Verdade, vale a indagação: há ou houve trauma, intelectual e estadista na evolução brasileira? A amostra de cidadãos testemunhas da instalação da aludida Comissão é um bom indicador para se arguir, debater e exercer o pleno direito ao contraditório.
Neste texto, restringirei minhas observações ao terceiro pilar, a questão dos estadistas. Tratarei do cenário e do contexto político brasileiro dos últimos trinta anos, sem citar nomes. Minha opção é tentar uma abordagem despersonalizada e, tanto quanto possível, conceitual e institucional.
O Maranhão e outras capitanias da Federação são laboratórios adequados para as experiências sociais, políticas e culturais requeridas. Seus IDHs e como corolário o padrão de saúde, moradia, educação, funcionamento da justiça, ou vice-versa, tornam-nos contra-exemplos das práticas satisfatórias de gestão do bem público. Pois bem, a condução maranhense tem sido extrapolada para o Brasil todo, durante tanto tempo, não importando que alinhamento ocupe a liderança maior do País. Por que não instituir uma Comissão da Verdade para avaliar quantas crianças perecera --- para ser mais realista, quantos milhares de crianças pereceram ---, inicialmente no Maranhão, e depois no restante do País, como resultado das práticas políticas, algumas quase medievais, oriundas daquela capitania?
Em face dos impulsos com gênese em Alagoas, o Parlamento brasileiro teve uma atuação exemplar em quadra recente de nossa evolução política. Quais as consequências, para a Nação, da falta de prosseguimento das ações saneadoras fomentadas pela sociedade e acolhidas pelo Poder Legislativo? Por que o exemplo maranhense no atinente a alinhamento de liderança regional com a liderança do País é imitado inequivocamente nessa outra capitania? Não seria razoável implantar uma Comissão da Verdade para avaliar as perdas do povo alagoano e as consequências para o País?
É razoável esperar que um intelectual, quando em função pública executiva, tenha o dever imprescindível de transformar o cenário educacional em sua esfera de atuação. Não deve haver dúvida de que poucos intelectuais ocuparam o mais alto cargo da Nação brasileira. Lamentavelmente, nos anos recentes, o desempenho educacional da juventude brasileira se ombreia com o dos países com as piores classificações, dentre aqueles que são mundialmente avaliados --- para dúvida não restar, a referência disponível é a do PISA, conjunto de procedimentos consagrados, no concerto dos países com nível minimamente satisfatório de organização. Ora, os brasileiros devem pleitear uma Comissão da Verdade para identificar as perdas resultantes da inépcia de intelectual na liderança da Nação e na solução das questões educacionais patrícias, com ênfase para as consequências da indigência educacional em todas as demais esferas coletivas, a começar pela morte de criancinhas, o abandono aos idosos, a segregação em favelas e tantas outras constatações, podendo algumas ser consideradas hediondas. Essa Comissão teria que apurar também se a verdade tem apenas uma faceta, apenas um lado, ..., se a verdade é, recursivamente, uma meia verdade, conforme enunciado por notável integrante da intelectualidade. Para ele, os assassinatos do Toledo e da Elizabeth Mazza Nunes, perpetrados por seus próprios companheiros, com motivações e ações tipicamente nazicomunistas --- para ficar apenas com dois exemplos --- não podem ser objeto de apuração da verdade. Goethe, dando solavancos no túmulo, tem razões para estar berrando “Lich, mehr licht!” (“Faaaltaaa luuuzzz!”).
Nossa evolução traz-nos para tempos mais recentes, onde a despeito da onda de otimismo generalizado, testemunhou-se um dos períodos de maior corrupção em nosso maltratado País. Por oportuno e por decência, deve-se asseverar que essa é também uma questão antiga. Basta lembrar Rui Barbosa e sua célebre Oração aos Moços --- “De tanto ver triunfar as nulidades...., o homem chega rir-se da honra, a desdenhar da virtude, a ter vergonha de ser honesto, ...”. Entretanto, o que assombraria mestre Rui é a dimensão, é a escalada, é a violência da malversação do bem coletivo, na atualidade. Temos alguns poucos meses para conferir se, do episódio do “mensalão”, resultará a catarse requerida e para confirmar a celebrada metáfora de François Andrieux, que colocou na boca do moleiro de Sans Souci o verso: --- Oui, si nous n’avions pas des juges à Berlin.” (“--- Sim, se não houvesse consciências em Brasília!”). O que se deve arguir é por que não implantar uma Comissão da Verdade para avaliar os destroços humanos resultantes do desvio de recursos públicos de hospitais, escolas e programas de moradia e saneamento, para as mãos de quadrilhas organizadas --- ressalte-se, segundo avaliação da alta instância do Ministério Público. Bom, um doutor defende a tese de que a verdade é como a Lua, deve ter uma face visível e outra oculta; seu homônimo, o doutor HC nunca defendeu tese, ou melhor, defende a tese de que o “mensalão” não existiu, como se fosse possível não existirem a Lua e a verdade. São homônimos não pela coincidência de siglas, mas pela coincidência de exegese da práxis político-financeira para manutenção do poder.
O presente, o que é o presente senão o esbarrar do passado com o futuro? A História ensina que, no passado, o nazismo foi um sistema de gestão que assassinou e torturou milhões de pessoas. Ensina também que o comunismo também assassinou e torturou outros milhões, quem sabe muito mais do que seu alter ego. O que significa defender, preconizar, lutar e matar pela implantação do nazismo ou do comunismo em um País como o Brasil? O que significa empreender essa luta, sofrer-lhe as conseqüências --- enfatize-se: é perversidade matar ou torturar, mesmo quando a cidadã ou o cidadão peleja pelo nazicomunismo ---, e depois mentir, asseverando que a luta era contra a ordem vigente? Que tal uma Comissão da Verdade, com o íntegro testemunho do Gustavo Gorender, para retirar a máscara que engana e agride?
Inicialmente, esta missiva cogitou de três vertentes da construção de um país ator global, mas discorreu sobre generalidades de apenas uma delas: a indigência de líderes ou ausência de estadistas em um período recente de nossa história, inferência que pode ser extrapolada para o conjunto inteiro, ressalvadas exceções poucas. A revolução transformadora --- que não precisa ser necessariamente armada ---, a intelectualidade e também a liderança de Estado são temas a serem explorados em nosso País, devendo a última ser tratada, não com a minha indignação, mas com elevada qualificação. Os intelectuais da atualidade precisam gerar intelectuais melhores para indicar os rumos de nossa evolução. Poucas organizações ou instituições tem o potencial do Estadão para estimular os questionamentos, propor os desafios, elaborar as provocações para que brasileiros com a requerida condição intelectual, com coragem e integridade, e, sobretudo, isentos de associação com a malversação do interesse coletivo e com ideologias anestesiadoras, tratem da questão.
Parece razoável nutrir a expectativa de que, a despeito da inequívoca simpatia do Estadão para com aqueles que defendem a Comissão da Verdade restrita, a parcialidade resultante dessa atitude possa ser atenuada para que continuemos a nos orgulhar do jornal e, sobretudo, para que haja um despertar em nosso País da omissão de parcelas ponderáveis de integrantes da política, da intelectualidade e da juventude, na construção de um caminho autônomo e com independência em relação aos países poderosos da atual conjuntura. E, especialmente, que faça germinar entre nós a decência, a ética e a generosidade no bem servir.
Ou então conformemo-nos com o País que é um dos cinco ou seis maiores produtores de automóveis no mundo, mas é o único dentre os oito primeiros que não tem uma indústria de automóveis pertencente a nacionais e com capital majoritariamente nacional; ou conformemo-nos com um País cujos equipamentos fundamentais de suas Forças Armadas são majoritariamente de concepção e produção estrangeira --- lembrando que não existe exemplo na História que contemple povos vitoriosos com equipamentos militares concebidos e fabricados fora das fronteiras nacionais; ou nos acovardemos diante da corrupção endêmica, sistêmica, desenfreada e incalculável; ou aceitemos com passividade um dos piores sistemas educacionais dos 60 países do mundo com melhor nível organizacional --- a propósito, sou filho de família modesta, sou neto de negra e bisneto de índia e não precisei da malfadada política de cotas para ingressar em uma das melhores Faculdades de Engenharia do País, bastou apenas mérito e escolas públicas satisfatórias; adicionalmente, jamais faltei a um dia de aula, do ensino fundamental às três pós-graduações realizadas, em decorrência de greve, não raro, entre nós, o direito universal de punir os menos aquinhoados, com a bênção daqueles a quem não interessa um povo letrado ---; ou, entre tantas outras aceitações, conformemo-nos com o fato de que a lista de livros mais vendidos do Estadão, quando comparada com as suas congêneres no mundo, é a que contém a maior densidade de autores estrangeiros.
Ou então vivamos em estado de catalepsia cerebral, imaginando Comissões da Verdade, que a rigor deveriam ser alcunhadas Comissões da Vergonha e Humilhação.
Não tenho qualquer constrangimento em ser acusado de detentor de agenda negativa. Entendo que a faculdade de interpretar o todo é um atributo fundamental do ser humano. Entendo que a capacidade de indignação é essencial para que haja a prevalência da ética, da decência e da justiça. E, por último e primacialmente importante, entendo que é fator evolutivo, com enorme relevância, a disposição e coragem para vasculhar as entranhas de qualquer organização, sociedade ou nação, para identificar-lhes as mazelas e construir uma agenda voltada para a realidade sem práticas medievais, sem corrupção, sem ausência de compromisso com Educação e sem meias verdades ou meias mentiras, não importando quão doloroso seja. Enfim, um País com harmonia, solidariedade, justiça e riqueza, com acesso assegurado a todos, à luz de irrepreensível prevalência do mérito.
Diante de qualquer juízo contrário, entendo que não devo, como Galileu, retratar-me, mas vale lembrar sua frase emblemática: “E pur se muove” (“Não adianta me forçarem a mentir!”).
Atenciosamente,
Aléssio Ribeiro Souto
Cidadão, contribuinte e eleitor
Militar da reserva

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Conta Tudo Cavendish - Uma Campanha Patriótica

Blogs e Colunistas
19/05/2012
 às 16:48

CAMPANHA PATRIÓTICA: “Conta tudo, Cavendish”. Ou: Os recados que o empresário mandou a políticos e a outras empreiteiras

Temos de dar início a uma campanha de natureza patriótica. Ela pode ser assim sintetizada: “Conta tudo, Cavendish!”.
Estou me referindo, claro!, a Fernando Cavendish, o dono da construtora Delta. O que parecia ser, inicialmente, um caso grave de associação de um político — Demóstenes Torres — com um contraventor — Carlinhos Cachoeira — está se revelando uma das mais fabulosas arquiteturas jamais descobertas de:
a) financiamento ilegal de campanha:
b) superfaturamento de obra;
c) compra — pura e simples — de parlamentares;
d) pagamento de propina.
A teia é extensa, intricada e cobre praticamente todo o território nacional, nas três esferas de administração: municipal, estadual e federal — nesta, em particular, há contratos de R$ 4 bilhões. Depois que José Dirceu — apontado pela Procuradoria Geral da República como o “chefe da quadrilha do mensalão” — prestou consultoria à Delta, a empresa teve um crescimento espetacular. Em parceria com Cachoeira (ainda não se conhecem detalhes dessa associação), tem-se uma certeza: o esquema é ecumênico, suprapartidário.
Lula e a ala mensaleira (ou a seu serviço) do PT imaginaram, inicialmente, que uma “CPI do Cachoeira” — E ELA É NECESSÁRIA, SIM, SE TRABALHAR DIREITO — reunia elementos para destruir a oposição, macular figuras do Supremo, pôr sob suspeita a Procuradoria Geral da República e intimidar a imprensa. Jornalistas que faziam o seu trabalho de apuração dos fatos ou tiveram conversas grampeadas ou seus nomes citados pelo contraventor e auxiliares. Foi o bastante para criar o mito, a farsa, a escandalosa falácia, de que o jornalismo estaria envolvido com o crime.
A VERDADE E OS RECADOS
Não! O jornalismo, felizmente, estava e está limpo nessa história! Mas o establishment político se mostra gravemente comprometido com o esquema Delta-Cachoeira. E está ocorrendo o óbvio: manobras, das mais escancaradas às mais sutis, estão em curso para limitar o poder explosivo que, descobriu-se, tem a CPI.
Cavendish não é do tipo dado a rompantes, mas mandou seus recados por intermédio de interlocutores. Reportagem de VEJA desta semana, de Otávio Cabral e Daniel Pereira, trata do assunto. Leiam um trecho. Volto em seguida.
(…)
Nos bastidores, Cavendish tem falado. E muito. Ele usou interlocutores de sua confiança para divulgar suas mensagens. Uma delas foi endereçada aos políticos. Seus soldados espalharam a versão de que a empreiteira destinou cerca de 100 milhões de reais nos últimos anos para o financiamento de campanhas eleitorais — e que o dinheiro, obviamente, percorreu o bom e velho escaninho dos “recursos não contabilizados”. Uma informação preciosa dessas deveria excitar o ânimo investigativo da CPI do Cachoeira. Os mensageiros de Cavendish também procuraram solidariedade na iniciativa privada. A arma foi ressaltar que o caixa dois da Delta, que serviu para financiar campanhas, segue um modelo idêntico ao de outras empreiteiras, inclusive usando os mesmos parceiros para forjar serviços e notas fiscais frias. A mensagem é: se atingida de morte, a Delta reagiria alvejando gente graúda. Como o navio nazista Bismarck, a Delta afundaria atirando. Faria, assim, um bem enorme ao interesse coletivo, mas seria mortal aos interesses privados. Os mensageiros de Cavendish têm espalhado que a mesma empresa fornecedora de notas frias da qual sua construtora se servia abastecia outras duas grandes empreiteiras.
(…)
Lula patrocinou a criação da CPI do Cachoeira ao considerá-la uma oportunidade de desqualificar instituições que descobriram, divulgaram e investigaram o esquema do mensalão, como a imprensa, o Ministério Público, o Judiciário e a oposição. Logo após a abertura da CPI, Fernando Cavendish passou a negociar a empresa com o grupo J&F, cujos donos eram parceiros preferenciais do governo Lula. A venda foi orquestrada pelo ex-presidente. O papel de Henrique Meirelles, presidente do Banco Central nos oito anos de mandato do petista e atual CEO do J&F, na manobra ainda não está claro. Meirelles não comenta, mas sabe-se que ele, desde os tempos de BC, não assina nada que não tenha a chancela de seus advogados particulares.
O J&F tem 35% de suas ações nas mãos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Mais que isso. Tomou emprestados mais de 6 bilhões de reais no banco. É, portanto, uma empresa semiestatal. Por meio de assessores, a presidente Dilma Rousseff deixou claro que seu governo não apoia a encampação da Delta pelo grupo J&F. A contrariedade de Dilma foi explicitada pela decisão das estatais de tirar a Delta de obras do Dnit e da Petrobras. Dilma determinou à Controladoria-Geral da União (CGU) que declare a empreiteira inidônea e, portanto, proibida de fechar contratos com a União. “O governo fará tudo o que estiver a seu alcance para esse negócio não sair”, diz um auxiliar da presidente.
(…)
Leia a íntegra na revista e veja quadro com os negócios da Delta Brasil afora.
Por Reinaldo Azevedo

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Estilo Arnaldo Jabour - 09 Mai 2012

Os corruptos ajudam-nos a descobrir o País. Há sete anos, Roberto Jefferson nos abriu a cortina do mensalão. Agora, com a dupla personalidade de Demóstenes Torres, descortinamos rios e florestas e a imensa paisagem de Cachoeira. Jefferson teve uma importância ideológica.
Cachoeira é uma inovação sociológica. Cachoeira é uma aula magna de ciência política sobre o Sistema do País. Vamos aprender muito com essa crise. É um esplendoroso universo de fatos, de gestos, de caras, de palavras que eclodiram diante de nossos olhos nas últimas semanas. Meu Deus, que riqueza, que profusão de cores e ritmos em nossa consciência política! Que fartura de novidades da sordidez social, tão fecunda quanto a beleza de nossas matas, cachoeiras, várzeas e flores.
Roberto Jefferson denunciou os bolchevistas no poder, os corruptos que roubavam por “bons motivos”, pelo “bem do povo”, na base dos “fins que justificam os meios”. E, assim, defenestrou a gangue de netinhos de Lenin que cercavam o Lula que, com sua imensa sorte, se livrou dos mandachuvas que o dominavam. Cachoeira é uma alegoria viva do patrimonialismo, a desgraça secular que devasta a história de nosso País. Sarney também seria ‘didático’, mas nada gruda nele, em seu terno de ‘teflon’; no entanto, quem estudasse sua vida entenderia o retrato perfeito do atraso brasileiro dos últimos 50 anos.
Cachoeira é a verdade brasileira explícita, é o retrato do adultério permanente entre a coisa pública e privada, aperfeiçoado nos últimos dez anos, graças à maior invenção de Lula: a ‘ingovernabilidade’.
Cachoeira é um acidente que rompeu a lisa aparência da ‘normalidade’ oficial do País. Sempre soubemos que os negócios entre governo e iniciativa privada vêm envenenados pelas eternas malandragens: invenção de despesas inúteis (como as lanchas do Ministério da Pesca), superfaturamento de compras, divisão de propinas, enfrentamento descarado de flagrantes, porque perder a dignidade vale a pena, se a grana for boa, cabeça erguida negando tudo, uns meses de humilhações ignoradas pelo cinismo e pela confiança de que a Justiça cega, surda e muda vai salvá-los. De resto, com a grana na ‘cumbuca’, as feridas cicatrizam logo.
O governo do PT desmoralizou o escândalo e Cachoeira é o monumento que Lula esculpiu. Lula inventou a ingovernabilidade em seu proveito pessoal. Não foi nem por estratégia política por um fim ‘maior’ – foi só para ele.
Achávamos a corrupção uma exceção, um pecado, mas hoje vemos que o PT transformou a corrupção em uma forma de governo, em um instrumento de trabalho. A corrupção pública e a privada é muito mais grave e lesiva que o tráfico de drogas.
Lula teve a esperteza de usar nossa anomalia secular em projeto de governo. Essa foi a realização mais profunda do governo Lula: o escancaramento didático do patrimonialismo burguês e o desenho de um novo e ‘peronista’ patrimonialismo de Estado.
Quando o paladino da moralidade Demóstenes ficou nu, foi uma mão na roda para dezenas de ladrões que moram no Congresso: “Se ele também rouba, vamos usá-lo como um Omo, um sabão em pó para nos lavar, vamos nos esconder atrás dele, vamos expor nosso escândalo por seu comportamento e, assim, seremos esquecidos!”
Os maiores assaltantes se horrorizaram, com boquinha de nojo e olhos em alvo: “Meu Deus… como ele pôde fazer isso?…”
Usam-no como um oportuno bode expiatório, mas ele é mais um ‘boi de piranha’ tardio, que vai na frente para a boiada se lavar atrás.
Demóstenes foi uma isca. O PT inventou a isca e foi o primeiro a mordê-la. “Otimo!” – berrou o famoso estalinista Rui Falcão – “Agora vamos revelar a farsa do mensalão!” – no mesmo tom em que o assassino iraniano disse que não houve holocausto. “Não houve o mensalão; foi a mídia que inventou, porque está comprada pela oposição!” Os neototalitários não desistem da repressão à imprensa democrática…
E foi o Lula que estimulou a CPI, mesmo prejudicando o governo de Dilma, que ele usa como faxineira também das performances midiáticas que cometeu em seu governo. Dilma está aborrecida. Ela não concorda que as investigações possam servir para que o Partido se vingue dos meios de comunicação e não quer paralisar o Congresso. Mas Lula não liga. “Ela que se vire…” – ele pensa em seu egoísmo, secretamente, até querendo que ela se dane, para ele voltar em 14. Agora, todo mundo está com medo, além da presidente. O PT está receoso – talvez vagamente arrependido. Pode voltar tudo: aloprados, caixas 2 falsas, a volta de Jefferson, Celso Daniel, tantas coisinhas miúdas… A CPI é um poço sem fundo. O PMDB, liderado pelo comandante do atraso Sarney, também está com medo. A velha raposa foi contra, pois sabe que merda não tem bússola e pode espirrar neles. Vejam o pânico de presidir o Conselho de Ética, conselho que tem membros com graves problema na Justiça. Se bem que é maravilhoso o povo saber que Renan, Juca, Humberto Alves, Gim Argello, Collor serão os ‘catões’, os puros defensores da decência… Não é sublime tudo isso? Nunca antes, em nossa história, alianças tão espúrias tiveram o condão de nos ensinar tanto sobre o Brasil. A cada dia nos tornamos mais sábios, mais cultos sobre essa grande chácara de oligarquias. E eu estou otimista. Acho que tudo que ocorre vai nos ensinar muito. Há qualquer coisa de novo nessa imundície. O mundo atual demanda um pouco mais de decência política. Cachoeira, Jefferson, Durval Barbosa nos ensinam muito. Estamos progredindo, pois aparece mais a secular engrenagem latrinária que funciona abaixo dos esgotos da pátria. A verdade está nos intestinos da política.
Mas, o País é tão frágil, tão dependente de acasos, que vivemos com o suspense do julgamento do mensalão pelo STF.
Se o ministro Ricardo Lewandowski não terminar sua lenta leitura do processo, nada acontecerá e a Justiça estará desmoralizada para sempre.
PS. Não temos a confirmação da Fonte.

Tudo o que interessa sobre a CV. Só as Ditaduras estabelecem uma Verdade....

Blogs e Colunistas
11/05/2012
 às 6:43

Tudo o que interessa dizer sobre a “Comissão da Verdade”, que já traz uma mentira na própria lei que a criou. Ou: O segredo de aborrecer é dizer tudo!

Que tal, meus caros, uma leitura sobre a Comissão da Verdade que vá um pouquinho além dos clichês sem nunca fugir dos fatos? Como sempre, aceito contestação. MAS TAMBÉM COM FATOS!
Dilma nomeou a tal Comissão da Verdade. Haverá uma solenidade com a presença de todos os ex-presidentes para dar posse ao grupo etc. e tal. A presidente, nesse particular, não imita Lula. Procura dar a certas decisões de governo a inflexão de política de estado e se mostrar menos exclusivista e mais tolerante do que o antecessor. Certamente a sua vaidade não rivaliza com a dele porque a de ninguém rivaliza. Não se esqueçam de que, quando Obama se elegeu nos EUA, o Apedeuta quase deu de ombros e sugeriu que inovação mesmo teria sido aquele país eleger um operário… Não sei se vocês entenderam esse particularíssimo ponto de vista… Mas fiz digressão. Volto. Estão nomeados os sete: José Carlos Dias (ex-ministro da Justiça no governo FHC), Gilson Dipp (ministro do STJ e do TSE), Rosa Maria Cardoso da Cunha (amiga e ex-advogada de Dilma), Cláudio Fonteles (ex-procurador-geral da República no governo Lula), Maria Rita Kehl (psicanalista), José Paulo Cavalcanti Filho (advogado e escritor), Paulo Sérgio Pinheiro (atual presidente da Comissão Internacional Independente de Investigação da ONU para a Síria).
Huuummm… Poderia ser muito pior, embora tenha algumas restrições, de que falo já. O problema não está no “quem”, mas no “quê”.
Qualquer historiador, não importa a corrente que abrace ou a ideologia, se tiver uma mínimo de seriedade e não for mero esbirro de partido ou grupo, repudia o próprio fundamento dessa comissão: COM A DEVIDA VÊNIA, SÓ DITADURAS ESTABELECEM VERDADES OFICIAIS DE ESTADO EM MATÉRIA DE HISTÓRIA!Como o Brasil não é uma ditadura, trata-se de um despropósito conceitual somado a outro despropósito aplicado.  O problema dessa comissão é que ela já nasce de uma mentira inserida em sua própria redação, como demonstrei aqui emartigo publicado no dia 6 de março.
Vocês já leram, por acaso, a íntegra da lei que criou a Comissão Nacional da Verdade? Quando quiserem, o texto está aqui. Vocês verão por que é importante fazê-lo caso queiram formar um juízo consequente da realidade. Não se esqueçam. Uma das causas daquela crise que alcançou centenas de militares da reserva foram declarações feitas pela ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos), segundo quem a Comissão da Verdade poderia resultar em processos criminais. Não pode!
No dia 2 de março, podia-se ler no jornal O Globo  o que segue em vermelho:
O secretário nacional de Justiça, Paulo Abrão, que também é presidente da Comissão de Anistia, considera que a Comissão da Verdade terá, como primeira missão, justamente a localização de desaparecidos e a identificação dos responsáveis. Depois, vai investigar as demais violações, como mortes e torturas. Numa outra etapa, vai identificar as estruturas da repressão, a cadeia de comando e a colaboração do setor privado com a ditadura.
“Não cabe investigar as ações da resistência. Estavam no direito legítimo de lutar contra a ordem ilegítima e a opressão. A Comissão da Verdade serve para investigar os crimes de Estado. Aqueles cometidos pelo ente que deveria proteger os cidadãos e não persegui-los”, disse Abrão.
Voltei
Errado! Não é o que está no texto que cria a Comissão, e este é o problema das pessoas que estão lidando com esse assunto: aprovar uma coisa e tentar fazer outra. À diferença de certo jornalismo, não escondo documentos; mostro-os. O que diz a lei?
“Art. 1o É criada, no âmbito da Casa Civil da Presidência da República, a Comissão Nacional da Verdade, com a finalidade de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional.”
Muito bem! Ao remeter para o Artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a lei estabelece que serão investigados casos de 1946 a 1988. Abrão deixa claro que isso é conversa mole. A comissão vai mesmo é se interessar pelo aconteceu a partir de 1964. Vejamos mais.
No Inciso III do Artigo 3º, consta um dos objetivos da comissão, a saber:
“III - identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos mencionadas no caput do art. 1o e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade;”
Atenção! A versão de que os crimes cometidos pela esquerda não podem ser investigados é mentirosa! A íntegra da lei está disponível.  Podem e devem ser investigadas as transgressões aos direitos humanos cometidas nos “diversos aparelhos estatais e na sociedade“. Mas isso também será ignorado.
Notem como Paulo Abrão não precisa nem mesmo de uma comissão para decretar uma verdade falsa como nota de R$ 13!
“Não cabe investigar as ações da resistência. Estavam no direito legítimo de lutar contra a ordem ilegítima e a opressão. A Comissão da Verdade serve para investigar os crimes de Estado. Aqueles cometidos pelo ente que deveria proteger os cidadãos e não persegui-los”.
Há aí mentiras várias e de várias naturezas. A lei, como visto, não limita a apuração aos crimes do estado. As ações terroristas que mataram quase 120 pessoas não eram “meras ações de resistência” nem objetivavam apenas “combater a ordem ilegítima”. Ora, com que isenção se vai estabelecer a “verdade” se o próprio texto da lei é distorcido com uma mentira escandalosa?
Volto à matéria do Globo. Lá também se lê:
Sobre as declarações do general Luiz Eduardo Rocha Paiva, de que deveriam ser julgados supostos crimes cometidos pela esquerda - onde cita a presidente Dilma - Gilney Viana afirmou que o objetivo da Comissão da Verdade não é esse:
“A comissão terá a finalidade de apurar os crimes cometidos pelos agentes do Estado. Os outros (dos grupos de esquerda) já foram apurados, objetos de inquérito e de processos judiciais. As pessoas cumpriram pena.”
Gilney é coordenador-geral do Projeto Direito à Memória e à Verdade da Secretaria de Direitos Humanos. Rocha Paiva, como sabem, fez tais declarações numa entrevista concedida à jornalista Miriam Leitão, excelente e isenta quando trata de economia.
Só para esclarecer: “julgado” não será ninguém, de lado nenhum. O general defendeu que os casos envolvendo a esquerda também fossem apurados. Não! Não é verdade que todas as pessoas envolvidas com os atos terroristas foram punidas. De todo modo, essa é uma falsa questão, que trai uma intenção: LEVAR AO BANCO DOS RÉUS as “pessoas do lado de lá”, e não apenas restabelecer “a verdade”.
Lei da Anistia
Então vejam:
1- Não é verdade que a lei que criou a Comissão da Verdade limite a apuração aos crimes cometidos a partir de 1964, mas assim será feito — contra o texto;
2- não é verdade que a lei que criou a Comissão da Verdade limite a apuração a crimes cometidos pelo estado, mas assim será feito - contra o texto;
3- não é verdade que a lei que criou a Comissão da Verdade abra brechas para a responsabilização criminal de quem quer que seja, mas é esse o espírito da coisa - contra o texto.
Sobre esse terceiro item, está lá na lei:
“Art. 6o Observadas as disposições da Lei no 6.683, de 28 de agosto de 1979, a Comissão Nacional da Verdade poderá atuar de forma articulada e integrada com os demais órgãos públicos, especialmente com o Arquivo Nacional, a Comissão de Anistia, criada pela Lei no 10.559, de 13 de novembro de 2002, e a Comissão Especial sobre mortos e desaparecidos políticos, criada pela Lei no 9.140, de 4 de dezembro de 1995.”
A Lei nº 6.683 é justamente a Lei da Anistia, cuja plena validade foi declarada pelo Supremo Tribunal Federal.
Eu e muita gente lutamos contra a ditadura para viver num estado democrático e de direito. Os delírios totalitários todos foram derrotados pela democracia. Autoridades do estado, como Maria do Rosário, Paulo Abrão e Gilney Viana não têm o direito, em nome de suas escolhas ideológicas, passadas ou presentes, de aplicar a lei conforme lhes der na telha.
Os nomesTenho restrições a duas integrantes da comissão. Sempre que temas dessa natureza vêm à baila, Dima dá um jeito de confundir a própria história com a história do país, o que não é um bom procedimento. Já fez homenagens a companheiros de luta em solenidades oficiais, ligando-os à construção da democracia, afirmação que nada tem a ver com uma Comissão da Verdade. Eleita e governando segundo o estado democrático e direito, não cumpre à presidente mistificar o próprio passado. Ao nomear aquela que foi a sua advogada para a comissão, é como se fizesse um desagravo a si mesma.
Não entendo o que faz no grupo Maria Rita Kehl, uma psicanalista que, com frequência, põe a razão de lado em nome da militância, nesse grupo. Em recenteintervenção no Programa Roda Viva, ela demonstrou um juízo bastante perturbado também sobre o presente. Imagino o que possa fazer com o passado. Afirmou, por exemplo, referindo-se justamente à Comissão da Verdade: “O Brasil é o único país da América Latina que não apurou os crimes da ditadura militar (…)” Fica parecendo que “ditadura militar” é uma instância única a ter governado o continente, o que é uma besteira. Um dia, dona Maria Rita, será preciso apurar os crimes dos Irmãos Castro, de Hugo Chávez, de Rafal Corrêa, de Evo Morales… A senhora não acha?
Mas entendo… Maria Rita certamente se refere a um país como a Argentina, por exemplo, em que a ditadura não cessa de gerar fatos políticos novos, que servem à pantomima de Cristina Kirchner e seus neofascistas… Países que se negam a transformar história em… história ficam presos ao passado e a candidatos a tiranos do presente. A África do Sul saiu do Apartheid sem criar uma comissão para definir a história oficial. Os EUA entraram na era dos direitos civis sem criar um tribunal da história. Já a Argentina, esta sim, criou um instituto só para definir uma versão oficial para os fatos. A Argentina… Aquele país que está indo para o buraco.
De todo modo, reitero, a lista dos sete nomes é menos ruim do que poderia ser. Há pessoas ali que jamais deram demonstrações de que não estejam comprometidas com a democracia e com o estado de direito. Só quero saber se terão a coragem de apurar os crimes cometidos pelos “aparelhos estatais” e pela “sociedade” — isto é, também os crimes cometidos pela esquerda.
É óbvio que não terão. Afinal, uma “Comissão da Verdade” encontra a sua vocação sendo um “Tribunal da História”. E terá, fatalmente, de mentir. E a maior mentira será trasformar os militantes daqueles grupos de esquerda em heróis da democracia — democracia que sempre repudiaram na teoria e na prática.
É incômodo dizer isso? É, sim! Ainda bem que a democracia, que eles nunca quiseram, mo permite!
Por Reinaldo Azevedo