sexta-feira, 23 de outubro de 2015
POBRE BRASIL
Pobre Brasil, outrora juvenil com verdes matas
Com as suas infinitas riquezas e cascatas
Hoje dilapidadas, sucateadas, saqueadas
A ponto de extrema penúria, sem mais nada
Pobre Brasil, aclamado rincão exuberante
Quebrou-se com um povo ignorante
Que vende seu voto em troca de cesta
Tal e qual prostituta da mais besta
Pobre Brasil, onde inexiste o civismo
Mas ao qual sobram pilhas de cinismo
De um povo heroico, bravo e retumbante
Restou uma turba bovina e ruminante
Como gado em direção ao abatedouro
Sem notar que teria a força no estouro
Pobre Brasil, que um dia já teve braço forte
E agora segue calmo, manso para o corte
Os Poderes da República corrompidos
Com os de bem cada vez mais reprimidos
Tendo que bancar a conta dos bilhões
Dos saqueadores do erário – vis vendilhões
Alguns poucos tentando nos moralizar
E os réprobos poderosos ficam a torpedear
Pobre Brasil, que no final do túnel não vê luz
Porque o pior de todos é o que nos conduz
Figura execrável, debochado e cachaceiro
Que transformou as instituições em puteiros
Cada um se vende do jeito que dá e pode
E classe média, como sempre, é quem se fode
Gostaria de ir embora dizendo: “não vou ligar”
Mas, aí, reflito: “o que meus netos irão herdar?”
Nesse momento a raiva cresce a transbordar
E confesso: é tanto ódio que chega a me cegar
Grito: “quero dessa canalha o meu país de volta!”
E pra chegar a tal digo: “os meios? Não importa!”
Que rolem as cabeças às centenas, aos milhares
Pois apenas desse jeito conseguiremos tal milagre
Saint-Clair Paes Leme – poeta revoltado de boteco pé-sujo, Membro da ABL (Associação de Bares e Lupanares) e voluntário para participar do Pelotão de Fuzilamento aos Corruptos.
quinta-feira, 22 de outubro de 2015
A LONGA EXPERIÊNCIA QUE NÃO DEU CERTO!
Mario Hecksher (*)
O Dicionário de
Política (Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e Gianfranco Pasquino; 5ª
edição; Editora UnB) contém um texto de Cesare Pianciola que nos fala o
seguinte sobre o Socialismo:
“Em geral, o Socialismo tem sido historicamente definido como
programa das classes trabalhadoras, que se foram formando durante a
Revolução Industrial. A base comum das múltiplas variantes do Socialismo
pode ser identificada na transformação substancial do ordenamento
jurídico e econômico, fundado na propriedade privada dos meios de
produção e troca, numa organização social na qual:
- o direito de propriedade seja fortemente limitado;
- os principais recursos econômicos estejam sob o controle das classes trabalhadoras;
- a sua gestão tenha por objetivo promover a igualdade social (e não somente jurídica ou política), através da intervenção dos poderes públicos.”
Foram justamente essas ideias, aparentemente maravilhosas, que
fascinaram muitos milhões de pessoas durante o século XX e parece que
ainda continuam fascinando outros tantos, principalmente na atrasada
América Latina, neste início do século XXI.
Ao longo do tempo, muitos teóricos estudaram as ideias socialistas e
as interpretaram com inúmeras variações. Alguns, de espírito
revolucionário, procuraram aplica-las, certamente na esperança que seus
intentos resolvessem os problemas que observavam na sociedade,
supostamente provocados pelo que eles chamaram de Capitalismo, um
sistema econômico que teria surgido em consequência da Revolução
Industrial. Assim sendo, governos autodenominados socialistas foram
estabelecidos em diversos países.
Na aplicação de suas teses, os governos socialistas, geralmente
estabelecidos através de revoluções que cerceavam de modo absurdo a
liberdade e a vida das pessoas, atacaram fortemente o direito à
propriedade privada, principalmente dos meios de produção. Mas jamais
colocaram os recursos econômicos, dos quais se apossaram, sob o controle
das classes trabalhadoras ou promoveram a tão decantada igualdade
social.
Ao contrário, os agentes dos governos estabelecidos passaram a
controlar os recursos econômicos, segundo a sua vontade, e a promoção da
igualdade social, sempre apregoada pela propaganda governamental, nunca
passou de grande embuste.
O resultado final de tudo isto foi sempre o caos econômico. Provas
desta afirmação podem ser facilmente extraídas da falência da União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e da mudança de rumo da China
comunista, esta obrigada a abandonar uma economia de molde socialista e
adotar princípios capitalistas, para poder se desenvolver.
Portanto, o que se viu e se vê é que o caos econômico, a pobreza e a
falta de liberdade se instalam em todos os países que insistem em pautar
sua política e sua economia em matrizes socializantes. Mais exemplos de
fracassos, pretéritos e atuais, podem ser citados: Coreia, Cuba,
Venezuela e Argentina. E não se diga que a culpa destes fracassos é dos
Estados Unidos da América, apontado como culpado e vilão desta triste
história. Aliás, esta é a grande mentira da propaganda socialista,
repetida nos dias atuais até a exaustão.
No início deste século XXI, não cabe mais discutir teorias políticas e
econômicas de matriz socialista, porque foi possível observar o
desempenho dos governos que as utilizaram durante os últimos 96 anos.
Aqueles que têm algum conhecimento, espírito crítico e raciocínio
lógico, nada destacam que possa servir de bom exemplo e que mereça ser
seguido.
Portanto, o melhor caminho é fechar essas ideias ultrapassadas, que
contrariam a lógica e o bom senso, no cofre do esquecimento e buscar
outras saídas para resolver os problemas que afligem o mundo.
Hoje, o socialismo é apenas uma longa e trágica experiência que não deu certo!
________
(*) O autor é coronel de Infantaria
e Estado-maior do Exército (reformado). É Mestre e Doutor em Estudos,
Planejamentos e Aplicações Militares, pelo Departamento de Educação e
Cultura do Exército. É Professor Emérito da Escola de Comando e
Estado-maior do Exército e professor de Liderança Militar na Academia
Militar das Agulhas Negras (AMAN).
quarta-feira, 7 de outubro de 2015
segunda-feira, 28 de setembro de 2015
... judices fiunt
·
Sérgio
Paulo Muniz Costa
A justificativa apresentada para retirar
um processo que investiga a ex-ministra da Casa Civil do governo Dilma da
alçada da 13a Vara da Justiça Federal em Curitiba seria ingênua, não
fosse o seu significado. Dizer que a justiça é única, que o Ministério Público
é único e que a Polícia Federal é única para justificar a tese de que todos os
outros juízes são competentes para lidar com o maior caso de corrupção da
História vai de encontro à flagrante realidade exposta nas rumorosas apurações
feitas tanto pelo Conselho Nacional de Justiça quanto pelas Corregedorias
Estaduais. Tomada ao pé da letra, é um erro crasso, pois, deixando de lado a
questão da idoneidade, em qualquer sistema judicial nem todos os juízes estão
aptos a julgarem questões complexas. Submetida à mais elementar análise
crítica, ela significa que vai se jogar fora toda a competência, e muito provavelmente
as provas (a grande meta dos advogados), acumuladas ao longo de um trabalho cuja excelência foi
reconhecida no próprio STF. O que vai sobrar? A prosperar a decisão,
incompreensivelmente apresentada à sociedade como “saneadora” (?), ficará o
registro de mais uma oportunidade perdida na História do Brasil.
Não é a primeira decisão do STF que causa
estupor, a começar pela homologação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do
Sol, em março de 2009; passando pelo forfait
no caso Battisti em 2011; até termos que engolir, no início de 2014, a
descaracterização da quadrilha que assaltou os cofres públicos no famigerado
mensalão. E como isso acontece? Aí entramos numa área de limites imprecisos, na
qual se prefiguram as decisões legais das diferentes instâncias do poder
constituído no País: o pensamento. Distintamente do politicamente correto, aquele
misto de conveniência e covardia que não permite sequer o julgamento objetivo
de fatos e acontecimentos, o pensamento ideologicamente orientado tem pouca
preocupação com coerência, conhecimento, justiça e bem comum, permeando algumas
das mais graves e controvertidas decisões tomadas recentemente no Brasil.
Via de regra, chega-se a essas decisões
pela desconstrução paulatina de um alvo, tanto na mídia como na academia. Ideias
heterodoxas começam a circular nos mais elevados níveis de decisão da República
pela macaqueação com ares epistemológicos veiculada em espaços privilegiados na
imprensa e em seminários monocórdios, até assumir contornos de verdade
consensual que justifica todo e qualquer absurdo. “Debate” significa divulgar o
mesmo em diferentes tons, aparentando diversidade de opiniões. Dificilmente se apresenta uma visão
substancialmente distinta da pretendida que logo se torna hegemônica, restando a
opinião pública não informada ou desinformada a respeito do que está em discussão
e de suas consequências. No caso da Lava Jato a onda de indignação contra a
corrupção impôs aos operadores da desconstrução uma abordagem mais discreta,
mas nem por isso menos audaciosa. A via escolhida foi a sua “matriz
ideológica”, a operação Mãos Limpas desencadeada na Itália no início dos anos
90. A irresponsabilidade palanqueira não teve o menor pudor em apresenta-la
como o “fim da política” que “resultou no Berlusconi”, soando como música em
gabinetes e salões de Brasília e instrumentalizando a sub-reptícia minagem da
Operação Lava Jato que tanto inquieta certos poderosos desta República.
No tocante à Mãos Limpas, tratando-se de
algo acontecido na Itália no final do século XX, antes de se deixar arrebatar
por achismos cibernéticos, é mais prudente ter em conta referências sólidas, começando,
por exemplo, com o vasto trabalho do
historiador Tony Judt. “Na Itália, onde, desde a guerra, os democratas-cristãos
haviam desfrutado de uma relação confortável e rentável com os banqueiros,
empresários, empreiteiros, chefes da cidade, funcionários do Estado e –
conforme insistentes rumores - a Máfia, uma nova geração de jovens magistrados
começou a romper com décadas de incrustrado silêncio público. Ironicamente, foi
o Partido Socialista que caiu primeiro, derrubado pelo tangentopoli ("cidade suborno'), o escândalo em 1992 que levou
a investigações sobre sua gestão da cidade de Milão. O partido caiu em desgraça
e seu líder, o ex-primeiro-ministro Bettino Craxi, foi forçado a fugir através
do Mediterrâneo para o exílio na Tunísia” (Post War, p. 746).
Pode
ter sido uma ironia que o PSI tenha sido o primeiro a cair, mas isso esteve
longe de ser uma injustiça. De nihilo
nihil diria Lucrécio. E Norberto Bobbio, um dos mais influentes teóricos e
pensadores da esquerda italiana, quase dez anos antes do tangentopoli, responderia ao convite de
Craxi para colaborar no programa para as eleições nos seguintes termos: “ ...o
problema é que com a sua prática inconsequente no exercício do poder, vocês
estão se tornando a cada vez menos confiáveis. Até mesmo as suas boas intenções
se parecem cada vez mais com aquelas das quais estão repletos os caminhos para
o inferno” (Diário de um século, p. 188).
À época da conclusão do seu livro, Judt
pôde escrever que “o único beneficiário duradouro deste terremoto político foi
um ex-cantor, o duvidoso magnata da mídia Silvio Berlusconi, que entrou para a
política, não tanto para promover a limpeza nacional da casa como para
assegurar que seus próprios negócios permanecessem seguramente inalterados”. Porém,
depois de dez anos e duas condenações de Berlusconi, não pode restar dúvida que
o grande legado para a Itália foi o de que ninguém está acima da Lei, nem mesmo
o supremo mandatário, algo impensável e infactível antes da Mãos Limpas, por
mais incompleta que a operação possa ter parecido aos olhos de tantos. Essa
história ainda está por ser escrita aqui no Brasil, pelo menos enquanto o nosso
Berlusconi andar faceiro a serviço da inalterabilidade do esquema que levou o
País ao presente quadro de insolvência política, econômica e moral.
Não há, por certo, somente um juízo no
País, mas o Brasil não prescindirá jamais do bom juízo, aquele que só poder
provir dos juízes que se fazem e não dos que são feitos.
*
Historiador
Sim!
* Sérgio Paulo Muniz Costa
Há motivos
para acreditar que a mais alta corte do País, composta em sua maioria por
ministros indicados pelo PT, alguns deles antes a ele associados ou às suas
causas, tomou uma decisão política ao fatiar a Operação Lava Jato e com isso,
mais do que beneficiar uma senadora, vai ajudar a blindar um ex-presidente e
impedir que o País conheça a extensão e a profundidade da corrupção que o
tomou?
Redesenha-se
com toda nitidez o quadro do mais chão paroquialismo da classe política
brasileira rebaixada ao andar de baixo do presidencialismo de coalizão para
criar uma fachada de governabilidade de um governo que não governa mais nada?
É absurdo
que, em meio ao maior escândalo de corrupção e uma das maiores crises políticas
da História do País, as principais lideranças da oposição se afastem da
campanha pelo impedimento da presidente, deixando-se neutralizar pela estratégia
do PT de rotular de golpe ou aventura uma medida constitucional reclamada pela
maioria da população brasileira como meio para estancar a corrupção e o arbítrio?
Teme-se que
a inconsistência das medidas econômicas propostas pelo governo e a sua
perseverança na defesa e no exemplo da irresponsabilidade fiscal agravem a
crise que assola o País com um potencial desestabilizador muito maior do que
qualquer medida institucional prevista em lei?
É de se
esperar que a eventual sobrevivência do presente esquema de poder e corrupção,
uma vez livre de constrangimentos, faça descer sobre o País um manto de
silêncio autoritário sobre ilegalidades de toda ordem e imponha à sociedade um
escorcho fiscal sem precedentes e sem fim?
Assiste-se,
mais uma vez, à deflagração de greves e badernas promovidas por sindicatos e
movimentos ditos sociais já dentro do governo que são mobilizados para
intimidar aliados, adversários, instituições e a sociedade em geral?
Todos esses
pesadelos – a politização escancarada do STF, o clientelismo da classe
política, a omissão da oposição, a criminosa irresponsabilidade administrativa,
o autoritarismo latente e a desordem chapa-branca – estão inextricavelmente
interligados nas causas da monumental crise que paralisa o País?
E diante de
tantos sins: há alguma coisa a fazer?
Sim! De
todas as formas, por nossas crenças, atitudes, convicções e esperanças, responder
aos detentores do poder corrupto e corruptor que nos oprime com a maior certeza
da História do Brasil!
NÃO!
* Historiador
Dez razões para o impedimento de Dilma
* Sérgio Paulo Muniz Costa
1.
O governo da presidente Dilma, pelas suas ações
ou as de seus membros de primeiro escalão, está sendo julgado ou investigado em
três altas cortes do País, o STF, o TCU e o TSE. O curso das investigações,
amplamente noticiado, indica que haverá condenação por uma das cortes, ou até
por todas. Qualquer dessas condenações implode a governabilidade, como já está
sendo percebido pela classe política.
2.
A esmagadora maioria da população brasileira
desaprova o atual governo, frustrada com o abismo entre as promessas de
campanha eleitoral e a dura realidade econômica que se impôs ao País, e
indignada com os prejuízos à coisa pública causados pela corrupção patrocinada
pelo governo do PT.
33.
A crise
econômica criada pelo governo do PT está sendo agravada pela maneira como este
lida com ela, sinalizando mais impostos, particularmente a infame CPMF, e sem
indicar, de maneira crível, a redução substancial de despesas públicas e a
melhoria dos serviços à população.
4.
A corrupção institucionalizada pelo governo do
PT nos últimos treze anos é firmemente rejeitada pela sociedade brasileira,
tanto por parcela majoritária da população, como organicamente pelas suas
instituições, que veem na continuidade do PT no poder a continuidade da
corrupção que sangrou o País.
5.
A incompatibilidade entre o governo do PT e a
base aliada que o sustentou nos últimos três mandatos presidenciais é
irreversível, tendendo a se agravar pelo confronto com o Legislativo sinalizado
pela insistência do governo em decretar aumentos de impostos.
6.
Os prejuízos econômicos ao País estão se
acumulando, agravando, e potencializando, à medida que se prolonga o impasse
político que bloqueia as soluções para a saída da crise econômica. O aumento da
dívida pública, a crise fiscal, o retorno da inflação e o expressivo decréscimo
da atividade econômica em todos os setores criam um quadro potencialmente
catastrófico que só pode ser evitado com medidas tomadas com base num consenso
político e social que o governo do PT não tem a menor condição de obter.
7.
O PT não tem mais coerência interna como
agremiação política capaz de propor uma saída para a crise política e econômica
em que o País mergulhou. A dissociação entre Lula, o criador, Dilma, a
criatura, presidente e parlamentares do partido denota a prevalência de meros
interesses pessoais, desaparecendo qualquer base programática na ação política
do partido.
8.
A degradação do perfil financeiro do País e de
suas principais empresas e bancos no cenário internacional continuará a
aumentar com a permanência do PT no governo e agravará substancialmente o
desfavorável quadro econômico interno.
9.
Um
governo fraco como o atual, desesperado por qualquer tipo de apoio, expõe o
País a pressões internacionais por acordos lesivos ao interesse nacional e pode
levar esse governo a concluir outros acordos absolutamente contrários à
soberania nacional.
10. A
sociedade brasileira, por sucessivas manifestações de massa, ampla expressão de
opinião e iniciativas parlamentares de oposição, está dizendo claramente que
não aceita pagar mais tributos ao governo do PT, por absoluta falta de
credibilidade deste. A aceitação dos inevitáveis sacrifícios pela sociedade
brasileira para superar a crise econômica do País passa pelo afastamento da
presidente Dilma do poder, necessariamente pela via democrática do impedimento.
* Historiador
quinta-feira, 3 de setembro de 2015
A música da política
São Paulo, 03 de Setembro de 2015
Opinião
São Paulo, 02 de Setembro de 2015 às 21:12
por
Sérgio Paulo Muniz Costa
A peça da proposta de orçamento
enviado pelo Governo ao Congresso deve ser entendida literalmente
como tal. Trata-se realmente de uma boa peça pregada à sociedade
No vale tudo da política apela-se
a todo tipo de metáforas, depois das futebolísticas, agora as
musicais, aproveitando-se os estilos muito próprios
brasileiros. Mas, o que realmente se ouve e dança na Praça dos
Três Poderes é um minueto, com os protagonistas da cena política
dando aqueles pequenos passos ensaiados de uma coreografia de
salão.
É nessa métrica barroca, em que
os factoides funcionam como batidas num compasso, que a cena
política mostra pares cada vez mais inusitados na dança do absurdo
no País.
É indigno do Brasil dar o seu nome
a uma agenda de medidas requentadas e inócuas que não estão
absolutamente à altura da gravidade do momento vivido pela Nação,
onde convergem Estado, governo e sociedade. É a sociedade que
contrata o Estado e é a sociedade que escolhe o governo, para que
ambos sirvam à Nação na qual ela se constitui.
A sociedade é definitivamente
sujeito, não predicado, como ela vem repetindo em sucessivas
e expressivas manifestações populares desde o início deste
ano. Tal qual tamborins, fora da orquestra desafinada do Planalto,
batem as panelas lembrando à classe política que ela serve e não
se serve da sociedade.
Por outro lado, o Brasil tem que
deixar de ser visto - acima de tudo por seus intelectuais a quem
cabe explica-lo - como uma sucessão de erros e de fracassos. Há,
por certo, lições não aprendidas das continuidades de nossa
História, mas delas se extraem alguns consensos que devem ser
preservados, como a identidade, a tolerância, o sincretismo e
a natural felicidade do brasileiro, nesta última a que se
resumiu a explicação que ouvi de um norte-americano especializado
em Brasil a outro que queria nos entender.
Mas deixando de lado critérios
subjetivos, por outros bem objetivos, particularmente no médio e
longo prazos, o Brasil é um dos maiores e mais importantes países
do mundo, e isso simplesmente não pôde acontecer de insucessos sem
fim, como, por vezes, pretende-se resumir nossa História.
O que nos exaspera, particularmente
nas crises, advém daquela famosa frase de Keynes: no longo prazo
estaremos todos mortos, o que leva nossas consciências a nos
acicatarem a fazer o que devemos, e agora. Aos mais velhos
cabe, além de fazer, lembrar, transmitindo aos mais jovens a sua
memória geracional, aquela que registra os detalhes e
filigranas de testemunhos e perspectivas que não se encontrarão em
livro algum.
Num período de aproximadamente
cinquenta anos, o Brasil evoluiu muito. Do presidente bossa nova que
construiu uma capital sem orçamento e do presidente síndico de uma
massa falida, do carisma sem responsabilidade e da
responsabilidade sem carisma, o País chegou até o consenso no
final do século XX em torno da responsabilidade com
democracia. O delicado equilíbrio que custou caro atingir é
exatamente o que está em jogo nesta crise, cuja culpa recai
precisamente num carisma que não tem a mínima responsabilidade
para com a Nação.
A peça da proposta de orçamento
enviado pelo Governo ao Congresso deve ser entendida literalmente
como tal. Trata-se realmente de uma boa peça pregada à sociedade,
na medida do que representa esse logro para a moralidade,
legalidade e legitimidade no País.
Ao longo do pitoresco minueto
político dançado em Brasília, ao qual não faltaram passos e
notas ridículas, como as alusões à CPMF, pela primeira vez
na brevíssima história da responsabilidade fiscal do Brasil,
propôs-se oficialmente um orçamento federal no qual a despesa
supera a receita.
Porém, engana-se quem vê nesse
rodopio um cândido lavar de mãos. Trata-se, na verdade, de uma
escalada temerária da luta política por recursos em todos os
poderes e níveis da federação. Mais um gesto ilegítimo de um
governo ilegítimo.
Numa das suas mais importantes
obras, A Política no Interior da Nações (1974), Joseph
La Palombara, talvez o último grande pensador político dos
nossos tempos, definiu com clareza como a “legitimidade da
autoridade deve ser distinguida de sua legalidade”, e apontou algo
que a maioria dos brasileiros estão assistindo com crescente
inquietação.
“No caso em que as políticas
determinadas por certas instituições ou governos forem
consideradas ilegítimas, a situação não tende a ser muito grave,
pois a maioria das políticas pode ser prontamente modificada. Isso
também é o caso das pessoas que ocupam cargos políticos, embora
seja normalmente muito menos difícil derrubar políticas do
que derrubar governadores. Quando as dúvidas quanto à legitimidade
dirigem-se às próprias instituições políticas/governamentais,
entretanto, o problema é realmente muito grave”.
Pouca gente duvida que o governo
Dilma é ilegítimo. O seu desregramento e a sua comprovada
falta de limites, de competência e de respeito por si próprio
e pela sociedade chegaram a nada menos do que três altas cortes do
País: o STF, o TSE e o TCU, algo indiscutivelmente grave.
Mas o que “é realmente muito
grave”, recorrendo-se novamente a La Palombara, é a dúvida que
vai crescendo em relação à capacidade das instituições fazerem
o que devem fazer diante do que é visto e sabido pela
sociedade.
É mais do que tempo do Brasil
dançar outra música, dissonantemente democrática. Talvez seja
tempo de uma nova bossa nova.
Nome aos bois
* Sérgio
Paulo Muniz Costa
Parece que ainda não ficou suficientemente claro que algo muito
grave está acontecendo no Brasil desde há alguns anos, e que pode
ficar muito pior nos próximos dias. A imprensa que denuncia
crimes que se confirmam pelas investigações policiais e nas
instâncias jurídicas, é chamada de golpista. Joaquim Barbosa, que
cumpriu com suas obrigações de magistrado na mais alta corte do
País, foi desacatado, ofendido e constrangido. A parcela expressiva
da sociedade que protesta pacificamente contra os desmandos do
governo é preventivamente ameaçada com o “exército” do
Stédile e com a pregação da luta armada feita no próprio
Palácio do Planalto.
Há,neste momento que vivemos no País, uma desproporção entre
ações e reaçõesna política que merece o mais atento
acompanhamento das autoridades que ainda estejam dispostas a merecer
tal título. Note-se bem que, a cada ação legal e legítima, no
caso, da imprensa livre, da justiça e da sociedade vem
correspondendo uma reação ilegítima do PT. Afinal, não pode mais
haver dúvida que é ilegítimo investir contra órgãos de imprensa
por que eles fazem denúncias que são legalmente apuradas e
confirmadas, que é ilegítimo atacar magistrados e cortes por
cumprirem suas funções institucionais e que é ilegítimo
constranger com ameaças físicas a população que deseja protestar
pacificamente contra a situação no Brasil.
É urgente e necessário que se ponha fim a essa ilegitimidade que
perpassa várias camadas da nossa vida política e social e que vem
sendo promovida de forma desabrida pelas lideranças do PT. A cada
discurso, a cada programa partidário na TV, a cada pajelança paga
com dinheiro público, a cada entrevista da presidente e a cada
anúncio para enfrentar a crise, o que fica sempre evidente éo
deboche, a afronta e a ameaça.
As notícias são adversas ao governo? A marquetagem saca rápido: a
presidente as deflete com mandiocais de estultices que não deixam
ninguém falar de outra coisa. As pessoas protestaram nas suas casas
contra o programa do PT na TV? Não há dúvidas: desqualifique-as
por atacado. Aproxima-se um protesto de rua conta o governo? Fácil:
esprema-o no calendário entre atos patrocinados pelo governo
que exalam truculência. A presidente não tem o que falar a respeito
das investigações sobre seu governo? Moleza: arruma-se uma
entrevista com pauta ensaiada para ela tachar as investigações de
golpismo. O ex-presidente Lula está sendo investigado? Sem
problemas: espalhe-se sua investidura ministerial, mesmo que
isso desrespeite as mais comezinhas normas de nomeação para
cargos no primeiro escalão de governo. A crise está paralisando o
País? Aí já é mais complicado, é preciso uma boa combinação
de audácia e subserviência: o ex-presidente, sem mandato algum,
convoca o vice-presidente da República, ministros e parlamentares,
todos em exercício, para lançar numa das casas do Congresso uma
agenda fictícia.
E assim chegamos ao atual estado de coisas. Não há dúvidas de que
perdemos no Brasil todo e qualquer senso crítico, à vista do que
aconteceu durante esta semana e que engolimos compassivos. Mais
delongas de prazos que não poderiam ter sido admitidas, mais vistas
de processos que deveriam ter sido vistos há muito, mais
controvérsias em torno de quem vota o quê e mais fatos criados
sem consistência e responsabilidade. Depois de tantos escândalos,
delações, investigações, prisões e protestos, e por que não
dizer, de tantas esperanças, delineia-se o quadro de que tudo vai
acabar ficando na mesma, para os mesmos, exatamente os
mesmos, fazerem mais do mesmo. Simples assim. Fica aqui o desafio aos
analistas do “não é bem assim”.
O mais inacreditável, para os que depositam toda sua esperança, e
se pode falar até de fé, nas instituições, é que tudo parece não
mais depender delas, mas sim dos protestos marcados para este
domingo, dia 16 de agosto. Não deveria ser assim, mas, por incrível
que pareça, é. Políticos, autoridades e assessores esfregam as
mãos, ansiosos, muitos deles omissos, outros tantos culpados,
torcendo pelo fracasso dos protestos que irá deixar tudo na mesma.
No entanto, uma notícia no início da noite desta 6a
feira deixou claro queo PT não está disposto a ficar parado. Ela dá
conta da intenção dos diretores do Instituto Lula estarem
presentesnas manifestações, insinuando que o próprio Lula também
iria.
Mesmo que não ocorra esse comparecimento de petistas e seus líderes
a uma manifestação que não é sua, já está consumada a
provocação, cujos efeitos se desconhecem. Se ela tiver sido
eficaz, vai esvaziar as protestos, para deleite do PT. Se ela
não tiver intimidado a população e, ao contrário, levar mais
pessoas à rua, vai colocar o PT e o governo em sérias dificuldades.
Mas uma coisa é certa. A população vai às ruas neste domingo e a
escalada da ilegitimidade que agora chega às raias da confrontação
tem que parar, imediatamente, para que o País resolva a crise que
enfrenta pela via constitucional, democrática e legal. E por tudo o
que se viu no País até agora, isso tem que ficar bem claro para o
PT e seus militantes mais afoitos, pois, independentemente dos
números e da repercussão das manifestações, se houver
enfrentamento e violência, a culpa terá nome, endereço e
bandeira.
* Historiador
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