* Sérgio
Paulo Muniz Costa
Parece que ainda não ficou suficientemente claro que algo muito
grave está acontecendo no Brasil desde há alguns anos, e que pode
ficar muito pior nos próximos dias. A imprensa que denuncia
crimes que se confirmam pelas investigações policiais e nas
instâncias jurídicas, é chamada de golpista. Joaquim Barbosa, que
cumpriu com suas obrigações de magistrado na mais alta corte do
País, foi desacatado, ofendido e constrangido. A parcela expressiva
da sociedade que protesta pacificamente contra os desmandos do
governo é preventivamente ameaçada com o “exército” do
Stédile e com a pregação da luta armada feita no próprio
Palácio do Planalto.
Há,neste momento que vivemos no País, uma desproporção entre
ações e reaçõesna política que merece o mais atento
acompanhamento das autoridades que ainda estejam dispostas a merecer
tal título. Note-se bem que, a cada ação legal e legítima, no
caso, da imprensa livre, da justiça e da sociedade vem
correspondendo uma reação ilegítima do PT. Afinal, não pode mais
haver dúvida que é ilegítimo investir contra órgãos de imprensa
por que eles fazem denúncias que são legalmente apuradas e
confirmadas, que é ilegítimo atacar magistrados e cortes por
cumprirem suas funções institucionais e que é ilegítimo
constranger com ameaças físicas a população que deseja protestar
pacificamente contra a situação no Brasil.
É urgente e necessário que se ponha fim a essa ilegitimidade que
perpassa várias camadas da nossa vida política e social e que vem
sendo promovida de forma desabrida pelas lideranças do PT. A cada
discurso, a cada programa partidário na TV, a cada pajelança paga
com dinheiro público, a cada entrevista da presidente e a cada
anúncio para enfrentar a crise, o que fica sempre evidente éo
deboche, a afronta e a ameaça.
As notícias são adversas ao governo? A marquetagem saca rápido: a
presidente as deflete com mandiocais de estultices que não deixam
ninguém falar de outra coisa. As pessoas protestaram nas suas casas
contra o programa do PT na TV? Não há dúvidas: desqualifique-as
por atacado. Aproxima-se um protesto de rua conta o governo? Fácil:
esprema-o no calendário entre atos patrocinados pelo governo
que exalam truculência. A presidente não tem o que falar a respeito
das investigações sobre seu governo? Moleza: arruma-se uma
entrevista com pauta ensaiada para ela tachar as investigações de
golpismo. O ex-presidente Lula está sendo investigado? Sem
problemas: espalhe-se sua investidura ministerial, mesmo que
isso desrespeite as mais comezinhas normas de nomeação para
cargos no primeiro escalão de governo. A crise está paralisando o
País? Aí já é mais complicado, é preciso uma boa combinação
de audácia e subserviência: o ex-presidente, sem mandato algum,
convoca o vice-presidente da República, ministros e parlamentares,
todos em exercício, para lançar numa das casas do Congresso uma
agenda fictícia.
E assim chegamos ao atual estado de coisas. Não há dúvidas de que
perdemos no Brasil todo e qualquer senso crítico, à vista do que
aconteceu durante esta semana e que engolimos compassivos. Mais
delongas de prazos que não poderiam ter sido admitidas, mais vistas
de processos que deveriam ter sido vistos há muito, mais
controvérsias em torno de quem vota o quê e mais fatos criados
sem consistência e responsabilidade. Depois de tantos escândalos,
delações, investigações, prisões e protestos, e por que não
dizer, de tantas esperanças, delineia-se o quadro de que tudo vai
acabar ficando na mesma, para os mesmos, exatamente os
mesmos, fazerem mais do mesmo. Simples assim. Fica aqui o desafio aos
analistas do “não é bem assim”.
O mais inacreditável, para os que depositam toda sua esperança, e
se pode falar até de fé, nas instituições, é que tudo parece não
mais depender delas, mas sim dos protestos marcados para este
domingo, dia 16 de agosto. Não deveria ser assim, mas, por incrível
que pareça, é. Políticos, autoridades e assessores esfregam as
mãos, ansiosos, muitos deles omissos, outros tantos culpados,
torcendo pelo fracasso dos protestos que irá deixar tudo na mesma.
No entanto, uma notícia no início da noite desta 6a
feira deixou claro queo PT não está disposto a ficar parado. Ela dá
conta da intenção dos diretores do Instituto Lula estarem
presentesnas manifestações, insinuando que o próprio Lula também
iria.
Mesmo que não ocorra esse comparecimento de petistas e seus líderes
a uma manifestação que não é sua, já está consumada a
provocação, cujos efeitos se desconhecem. Se ela tiver sido
eficaz, vai esvaziar as protestos, para deleite do PT. Se ela
não tiver intimidado a população e, ao contrário, levar mais
pessoas à rua, vai colocar o PT e o governo em sérias dificuldades.
Mas uma coisa é certa. A população vai às ruas neste domingo e a
escalada da ilegitimidade que agora chega às raias da confrontação
tem que parar, imediatamente, para que o País resolva a crise que
enfrenta pela via constitucional, democrática e legal. E por tudo o
que se viu no País até agora, isso tem que ficar bem claro para o
PT e seus militantes mais afoitos, pois, independentemente dos
números e da repercussão das manifestações, se houver
enfrentamento e violência, a culpa terá nome, endereço e
bandeira.
* Historiador
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