* Sérgio Paulo Muniz Costa
O que está havendo com o Brasil, o país do
futebol com mais católicos do mundo, que viveu confrontos nas imediações dos
estádios em que sua seleção brilhava e agora se inquieta às vésperas da
visita do Papa Francisco? Como é possível que tradicionais motivos de alegria
e devoção da população brasileira tenham se transformado em oportunidades de
frustração e constrangimento? Em pouco mais de um mês, a imagem do País foi
alterada e hoje nos sentimos todos atingidos por algo que não compreendemos mas
que nos acontece. A única certeza nesses dias de tumulto é que os nossos
destinos vão depender do que decidirmos fazer com o que nos acontece, e o pior
que podemos fazer é não termos a mesma audácia daqueles que estão agindo. No
nosso caso, da esmagadora maioria da população, a audácia para pensar.
A semana foi pródiga em acontecimentos.
Abriu-‐se com as declarações de uma agência do governo que indicavam os
protestos como a maior ameaça à visita do Papa, quase simultânea à
manifestação do super-ministro de que “o povo faria a segurança do Papa” e
à reunião de ministros de estado com representantes do Vaticano para
pressionarem por mudanças na programação oficial. Isto é o governo federal
atuando como caixa de ressonância de um não se sabe o quê. Ao mesmo tempo, o
ex-presidente que em passado não distante esteve com blogueiros simpáticos ao
PT, ressurgiu sorridente e saudável, cercado de jovens, fazendo em termos
chulos e demagógicos a apologia dos protestos. Isto todo mundo sabe para quê,
diante do que se dilui outra dúvida excruciante: a criatura está cumprindo o
papel que lhe foi atribuído, desde o início.
Se a violência que tomou as ruas do Leblon na
noite da 4a feira, dia 18 de julho, foi desconcertante, a coletiva de imprensa
da cúpula de segurança pública do Rio de Janeiro no dia seguinte foi
patética. Repetiu-se ali a fraqueza das autoridades para enfrentarem no campo
das ideias a vontade perversa que está transformando as ruas em campo de
batalha. Bovinamente vamos aceitando a neutralização das forças de segurança
pública mediante o constrangimento midiático praticado por uma facção da
imprensa despudoradamente simpática ao caos e por intermédio da pressão
de entidades nacionais e estrangeiras que sem terem qualquer responsabilidade
pela Lei e pela Ordem pretendem impor limitações absurdas à sua imposição.
E assim se encerra de forma melancólica esta semana surpreendente, com a
disseminação não contestada da notícia de que as autoridades não sabem como
lidar com os protestos durante a visita do
Papa.
A maioridade politica da sociedade brasileira
não a protege dos riscos e dos assaltos às suas instituições, aliás a
nenhuma sociedade. A presente conturbação do quadro político nacional está
inserida na moldura sucessória que se completa em 2014 e isso está patente nos
conflitos dentro do condomínio do poder e entre os poderes da República, cuja
origem é a vontade do exercício absoluto do poder pelo PT. Há parlamentares,
autoridades e lideranças que resistem, na forma da Lei e dentro de suas
atribuições, ao projeto de poder que ameaça a democracia brasileira, mas as
suas atitudes e ações minguarão na medida em que continuarmos refugiados na
cômoda visão dos protestos como iniciativas espontâneas e legítimas de uma
população insatisfeita, ou pior, como já circula, extasiados na miragem
sebastianista de que seremos “salvos” por uma intervenção não se sabe de
quem, da qual desembarcam manifesta e preventivamente os militares, fartos de
serem acusados de golpistas de oportunidade justamente pelos eternos golpistas
da História.
Na verdade, a nossa maioridade política se
confirma pela resistência ao pensamento que pretende pensar por nós, a
começar pelo da parcela da intelligentsia brasileira sempre tão diligente e
“científica” para atacar as crenças religiosas de tantos, mas sempre tão
incapaz de se despir do próprio criacionismo com que insiste em impor fatos
estranhos à sociedade para recriá-la a seu molde. E não se diga que aqui se
recorre ao reducionismo moralista da luta entre o bem e o mal. É mais simples:
trata-se da escolha entre o bom e o ruim e é mais do que tempo de sabermos
distinguir um do outro.
* Historiador
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