Por Chiqui
Avalos (*)
02-07-2012
Como num verso célebre de meu
inesquecível amigo Vinicius de Moraes, “de repente, não mais que de
repente”, alguns governos latino-americanos redescobrem o velho e sofrido
Paraguay e resolvem salvar uma democracia que teria sido ferida de morte com a
queda de seu presidente. Começa aí um engano, uma sucessão de enganos, mentiras
e desilusões, em proporção e intensidade que bem serve a que se companha uma
melodiosa guarânia, mas de gosto extremamente duvidoso.
Sucedem-se fatos bizarros na vida
das nações em pleno século XXI. Uma leva de chanceleres, saídos da espetaculosa
e improdutiva Rio+20, desembarca de outra leva de imponentes jatos oficiais no
início da madrugada de um incomum inverno, e - quem sabe estimulados pela baixa
temperatura - se comportam com a mesma frieza com que a “Tríplice
Aliança” dizimou centenas de milhares de guaranis numa guerra que arrasou a
mais desenvolvida potência industrial da América Latina.
Surpresos? Pois, sim, não é para
menos. Éramos ricos, muito ricos, industrializados, avançados, educados, cultos,
europeizados, amantes das artes, dos livros, das óperas, do desenvolvimento.
Nossos antepassados brilharam na Sorbonne e assinaram tratados acadêmicos,
descobertas científicas ou apurados ensaios literários. A menção de nossa origem
não provocava o deboche ou ironia tão costumeiros nos dias tristes de hoje, mas
profundas admiração e curiosidade dos que acompanhavam nossa trajetória como
Nação vencedora. Não ficamos célebres como contrabandistas ou traficantes, mas
como povo empreendedor e progressista. A organização de nossa sociedade, a
intensa vida cultura, o progresso econômico irrefreável, a bela arquitetura de
nossas cidades, nossos museus e livrarias, a invulgar formação cultural de nossa
elite, a dignidade com que viviam nossos irmãos mais pobres (sem miséria ou
fome) impressionavam e merecem o registro histórico. A rainha Vitória, que não
destinou ao resto do mundo a mesma sabedoria com que governou e marcaria para
sempre a história do Reino Unido, armou três mercenários e eles dizimaram a
potência que, com sua farta e boa produção e espírito desbravador, tomava o
mercado da antiga potência colonial aqui, do lado de baixo do Equador. Brasil,
Argentina e Uruguay, como soldados da Confederação, nos arrasaram. Nossos campos
foram adubados pelos corpos de nossos irmãos em decomposição, decapitados à
ponta de sabre e com requintes de sadismo. O Conde D’Eu, marido de quem
libertaria os negros da escravidão e entraria para a história do Brasil,
comandava pessoal e airosamente o massacre. Os historiadores, essa gente
bisbilhoteira e necessária, registraram seu apurado esmero e indisfarçável
prazer. O nefasto delegado Sérgio Fleury teve um precursor com quase um século
de antecedência...
Nossas cidades terminaram por ser
habitadas por populações majoritariamente compostas de mulheres e crianças.
Poucos homens restaram do genocídio perpetrado. Pedro II, que marcaria a
história do Brasil por sua honradez, comportou-se de forma impressionante nessa
obscura página da história do Brasil, mas inversamente conhecidíssima na
história de meu país: não moveu uma palha ou disse palavra acerca do sadismo de
seu genro criminoso. Documentos por mim revirados no Arquivo Nacional, no Rio de
Janeiro, mostram a assinatura do velho Imperador autorizando a compra de barcos,
chatas, cavalos e tudo o que fosse necessário para uma caçada de vida ou morte
(mais de morte, certamente) à Lopez. Não bastava derrotar o déspota esclarecido,
o republicano que os humilhava, o que havia desafiado todos os impérios, o da
Inglaterra, o do Brasil, o da Espanha... Era preciso assinar seu epitáfio e
esculpir sua lápide. E assim foi feito.
Derrotados, nunca mais fomos os
mesmos. Passamos a ser conhecidos por uma República já bicentenária, mas
atrasada em comparação aos vizinhos. Enfrentamos uma guerra cruel com a Bolívia
na primeira metade do século passado. Roubaram-nos importante faixa territorial
do Chaco, região paradoxalmente inóspita e riquíssima. Ganhamos a guerra. Nossos
soldados mostraram a valentia e patriotismo que brasileiros, uruguaios e
argentinos bem conheceram mais de meio século antes. Nossa incipiente aviação
militar e seus jovens pilotos assombraram os experts norte-americanos pela
refinada técnica e o sucesso de suas ações contra o agressor. Mas numa história
prenhe de ironias, vencemos a guerra e... jamais recuperamos as terras! Os
bolivianos, que jamais olham nos olhos nem das pessoas nem da história,
certamente se rejubilam em sua “andina soledad”, e como os argentinos
depois da inexplicável Guerra das Malvinas, sabem-se
“vice-campeones”...
Mal saímos da Guerra do Chaco e
experimentamos a mesma e usual crônica tão comum a rigorosamente todos os outros
países latino-americanos. Golpes e contra-golpes, instantes de democracia e
hibernações em ditaduras ferrenhas. Presidentes se sucederam despachando no
belíssimo Palácio de Lopez e vivendo na vetusta mansão de Mburuvicha
Roga (“A casa do grande
chefe”, em guarani). Uns razoáveis, outros deploráveis. Nenhum deles,
entretanto, recuperou a glória perdida dos anos de riqueza, opulência e fartura.
Um herói da Guerra do Chaco tornou-se ditador e nos oprimiu por mais de três
décadas. Homem duro, mas de hábitos espartanos e por demais interessante, o
multifacético Alfredo Stroessner não recusou o papel menor de tirano, mas
construiu com o Brasil a estupenda hidrelétrica de Itaipu, a maior obra de
engenharia de seu tempo, salvando o Brasil de previsível hecatombe energética.
Foi parceiro e amigo de todos os presidentes do Brasil de JK a Sarney. Com os
militares pós-64 deu-se às mil maravilhas, mas foi de suas mãos que o exilado
João Goulart recebeu o passaporte com que viajaria para tratar sua saúde com
cardiologistas franceses. Deposto, o velho ditador morreu no exílio, no Brasil.
Nós que o combatíamos (nasci em Buenos Aires , onde meu pai, empresário de
sucesso mas adversário da ditadura, curtia seu exílio) jamais soubemos de ação
qualquer, uma que fosse, do Brasil em seus governos democráticos contra a
ditadura do general que lhes deu Itaipu.
Depois de duas décadas da
derrubada de Stroessner, nos aparece Fernando Lugo. Sua história é peculiar. Era
bispo de San Pedro, simpaticão e esquerdista, pregava aos sem-terra e parecia
não incomodar ninguém, nem aos fazendeiros da área. Pelos idos de 2007 o então
presidente Nicanor Duarte Frutos, um jovem jornalista eleito pelos colorados,
resolve seguir o péssimo exemplo de Menem, Fujimori e Fernando Henrique, e deixa
clara sua vontade de mudar a Constituição e permanecer no presidência, através
do instituto inexistente da reeleição. Seu governo era mais que sofrível e –
descupem-nos a imodéstia latreada em nossa história – nós, os paraguaios, não
somos dados ao desfrute de mudar nossa Carta Magna ao sabor da vontade de
presidente algum.
O país se levantou contra a
aventura e ele, o bispo bonachão, justamente por não ser político e garantir que
não alimentava qualquer ambição de poder, é escolhido para ser o orador de um
grande ato público, com dezenas de milhares de pessoas no centro de Assunção.
Pastoral, envolvente, preciso, o Bispo de San Pedro cativou a multidão, deu
conta do recado e catalisou a imensa indignação da cidadania. A aventura
continuísta de Nicanor não foi bem-sucedida, mas, com a sutileza de um príncipe
da Igreja nos intricados concílios que antecedem a fumacinha branca no Vaticano,
nos aparece um candidato forte à presidência da República: ‘habemus
candidatum’! A batina vestia mais que um pastor, escondia um homem frio,
ambicioso, ingrato e profundamente amoral.
Seu primeiro problema foi com a
Santa Madre Igreja. O Santa Sé, certamente por saber algo que nós não sabíamos,
vetou sua disposição política. Não, de jeito algum, ele jamais poderia ser
candidato. A igreja católica combateu a ditadura do general Stroessner com
imensa coragem e ação firme, mas não queria ocupar a presidência do país.
“Roma coluta, causa finita” (“Roma falou, questão decidida”). Mas não
para Lugo, que deixou seu bispado, despiu a batina e virou às costas a quem lhe
educou e lhe acolheu no seu seio. Poucos e corajosos colegas Bispos e padres o
apoiaram abertamente. Na última sexta-feira, depois de três anos sem vê-lo ou
serem por ele procurados, esses mesmos amigos e apoiadores foram até a
residência presidencial pedir – em vão – que Lugo renunciasse à presidência do
Paraguay para que se evitasse derramamento de sangue. O homem seduzido pelo
poder disse não com frieza, levantando-se e despachando aqueles inoportunos
portadores da palavra divina.
Candidato sem partido, entretanto
com as simpatias da clara maioria do eleitorado. Filiou-se, pois, a um partido e
o escolhido foi o centenário e respeitável PLRA, dos liberais, há mais de 60
anos fora do poder e com a respeitável bagagem de uma corajosa oposição à
ditadura stroessnista. Como um Jânio Quadros, Lugo filiou-se ao Partido Liberal
Radical Autêntico e usou sua bandeira, sua história e sua estrutura capilarizada
em toda a sociedade paraguaia. E depois deu-lhe um adeus de mão fechada, frio e
indiferente.
Eleito, desfez-se de todos os
companheiros de jornada. Um a um. Stalin não apagou tantos nas fotos oficiais do
Kremlin como o ex-bispo o fez. Mas demitiu os mais qualificados, por sinal.
Restaram-lhe os cupinchas, os facilitadores de negócios e de festinhas íntimas,
os “operadores” e alguns incautos esquerdistas para colorir com as tintas de um
risível ‘socialismo guarani’ o governo de um homem que chegou como o
Messias e terminaria como um Judas Escariotes.
Lugo poderia emprestar seu nome e
sua trajetória de vida política (e pessoal, também) ao mestre Borges e tornar-se
uma das impressionantes personagens da “História Universal da Infâmia”. Um
infame, não mais que isso! Mal foi eleito e empossado, sucedem-se escândalos e
se revela seu procedimento moral. Filhos impensados para um supostamente casto
Bispo. Vários. Todos jamais reconhecidos ou amparados, gerados com mulheres as
mais pobres e sem instrução alguma, do meio rural, humilhadas depois de usadas,
uma delas com apenas 16 anos quando da gravidez. Se traíra a sua Igreja, por
qual razão não nos trairia? E traiu.
Não passou um mês sequer durante
seus três anos de governo sem que viajasse a um país qualquer. Com razão ou sem
nenhuma, tanto fazia, e lá se ia ele, o alegre viajante para conferências
esvaziadas ou cerimônias de posse de mandatários sem importância ou relevo para
o Paraguay. As pompas do poder o abduziram como a nenhum déspota de república
bananeira do Caribe. Os comboios de limusines com batedores estridentes, as
festas e beija-mãos, os eternos e maviosos cortesãos do poder, as belas
mulheres, as mesas fartas, os hotéis cinco estrelas, a riqueza, a opulência, os
“negócios”. O despojado ex-bispo tornou-se grande estancieiro, senhor de terras,
plantações e gado. O presidente que tomou posse calçando prosaicas sandálias
como símbolo de humildade, revelou-se um homem vaidoso e fetichista. Como que a
vestir a mentira em que ele próprio se tornou, passou a envergar elegantes e
bem-cortadas túnicas encomendadas à alfaiates da celebérrima e caríssima Savile
Row, templo londrino da moda masculina. No detalhe, o estelionato (mais um):
colarinhos eclesiásticos. Afeiçoou-se a lindas e jovens, digamos, “modelos”, que
floriram sua vida e a imensa banheira Jacuzzi que mandou instalar na austera e
velha residência presidencial. Muitas delas o precediam mundo afora, esperando-o
em hotéis fantásticos e palácios, nas vilegiaturas internacionais. Viajavam com
documentos oficiais. Kaddafi auspiciava passaportes diplomáticos a terroristas,
Lugo a prostitutas.
Sua afeição pelos jatinhos e
jatões chegou às raias do fetiche: passou boa parte de seu peculiar mandato a
bordo deles. Fretados à empresas de táxi aéreo de outros países, mandados pelos
amigões Hugo Chávez e Lula, outros emprestados sabe-se lá por uns tais e
misteriosos amigos. Chocou-se com o brasileiro Jorge Samek, fundador do PT e
competente gestor, que na presidência brasileira da Itaipu resolveu vetar
capricho juvenil do ex-bispo e delirante presidente: a poderosa binacional
compraria um jato para seu uso. Um Gulfstream estaria de bom tamanho, quem sabe
um Falcon, ou até um brasileiríssimo Legacy, mas ele precisava ardentemente de
um jato para chamar de seu. Depois mandou que o comandante da Força Aérea
negociasse um Fokker 100, adaptado com suíte e ducha. Nada feito, o raio de ação
seria pequeno e ele precisava ganhar o mundo. Por fim, nos estertores de seu
governo, entabulava a compra de um Challenger, usado mas chique, de um cartola
do futebol paraguaio. O preço, como sempre, mais um escândalo da Era Lugo: pelo
menos o dobro de um modelo novo, saído de fábrica...
Obras viárias? Imagine. De
infraestrutura? Nenhuma. Modernização do país? Nem pensou nisso. Crescimento
econômico? Sim, mas por obra de uma agricultura forte, de empresários jovens e
ambiciosos, de uma indústria florescente e de um ministro da economia, Dionísio
Borda, que destoou da regra geral do governo Lugo: competente e austero, imune
às vontades do presidente e distante da escória que o cercava. A cada novo dia,
no parlamento, nas redações, nos sindicatos, nos foros empresariais, nos
encontros de amigos, um novo comentário, uma nova história de mais uma negociata
dos assessores e companheiros de Lugo. Proporcionalmente, nem na ditadura de
Stroessner (mais de três décadas), se roubou tanto quanto no governo
pseudo-esquerdista de Fernando Lugo (menos de três anos). Já com Lugo deposto,
seu secretário mais forte, Miguel Lopez Perito, telefonou à diretoria da Itaipu
solicitando a bagatela de US$ 300 mil para organizar uma manifestação em defesa
do governo. Queria ao vivo e a cores, "na mala", por fora, não contabilizado, no
"caixa 2". Que tal? Fato tornado público por um diretor da binacional e
revelador do modus-operandi da verdadeira quadrilha que comandava o
país.
Seu processo de “Juízo Político”
– algo como um processo de impeachment – está previsto na Constituição do
Paraguay, e não foi uma travessura histórica de meia dúzia de líderes políticos
ou parlamentares revidando as descortesias de Lugo para com os partidos, os
empresários, os paraguayos todos. Que tipo de presidente era esse que teve 73
deputados votando por sua queda contra apenas 1 solitário voto? Que espécie de
chefe da Nação era esse que teve 39 votos contrários no Senado contra apenas 4
de senadores fiéis ao seu desgoverno? Não teve tempo, apenas duas horas para
defender-se, dizem. Ora, a Constituição não determina tempo, apenas assegura-lhe
o direito de defesa, exercido através de competentíssimos advogados, que fizeram
exposições brilhantes na defesa do indefensável. Um deles, Dr. Adolfo Ferreiro,
admitiu claramente que o processo era legal. De outro, Dr. Emilio Camacho, em
imponente ironia da história, os magistrados da Suprema Corte extraíram em um de
seus celebrados livros aqueles ensinamentos necessários e a devida
jurisprudência para rechaçar chicana jurídica do já ex-presidente contra o
processo legal, constitucional e moral que o defenestrou. C’est la vie,
Monsieur Lugo!
Em Curuguaty, num despejo de
terras ocupadas pelos "carperos" (os sem-terra daquí), dezenas de mortes de
ambos os lados. Lugo e seu ministro do interior, o belicoso senador Carlos
Filizzola, foram avisados de que havia uma emboscada pronta para as forças
militares. Com a empáfia e a absoluta irresponsabilidade que os caracterizou do
primeiro ao último dia, e fiel aos amigos que manejam o MST daquí e infernizam a
vida de nossos produtores rurais (entre os quais os 350 mil brasileiros que aquí
plantam, colhem e vivem, nossos irmãos "brasiguayos"), ambos ordenaram a ação
que se tornou uma tragédia na história de nosso país. Poderia citar, também, o
EPP (Exército do Povo Paraguaio), guerrilha formada por terroristas intimamente
ligados a Lugo em seus tempos no bispado de San Pedro. Jamais as forças de
segurança puderam fazer nada contra eles. Mapeados, identificados, monitorados e
livres! Lugo se manteve fiel aos bandidos pelos quais mostra clara e pública
afeição. Como o respeitado Belaúnde Terry, no Perú, que permitiu com seu
"democratismo" o crescimento do terror representado pelo Sendero Luminoso de
Abimael Guzmán, o nada respeitável Lugo é o pai e a mãe do EPP.
Fernando Lugo foi um acidente em
nossa história. Necessário, mas sofrido. Seus defeitos superaram suas virtudes.
Aqueles eram muitos, essas muito poucas. Nós que nele votamos, sequiosos de um
Estadista, nos deparamos com um sibarita. Seu legado é de decepção e fracasso.
Não choraram por ele dentro de nossas fronteiras, e os que o defendem foram
delas o fazem muito mais pensando no que lhes pode ocorrer do que por
solidariedade ao desfrutável governante e desprezível homúnculo que
cai.
O fim de seu governo dói mais a
um já dolorido Chávez do que a nós. A Senhora Kirchner, radical na condenação
que nos impõe, se esquece de nossa parceria na importante e gigantesca usina
hidrelétrica de Yaciretá, e amplia sua lucrativa viuvez acolhendo em seu seio
choroso o decaído amigo. Solidária? Nem tanto, apenas oportunista e sabendo que
se abriu o precedente para que os parlamentos expulsem os incapazes. Na Bolívia
o sentimento popular em relação ao sectário e também bolivariano Evo Morales não
é diferente do sentimento dos paraguayos por Lugo no outono de sua aventura
presidencial. É pior. O relógio da história irá tocar as badaladas do fim de uma
aventura mais que improdutiva: raivosa, racista e liberticida.
Não compreendemos a posição do
Brasil. Ou não queremos compreender, tanto é o bem que lhe queremos. Nos arrasou
como sicário da Rainha Vitória e nós lhe perdoamos e juntos construímos o
colosso de Itaipu. O tratamos bem e ele defende a continuidade de uma das piores
fases de nossa história, em nome do quê? Nega-nos o direito à autodeterminação,
mas se esquece do papelão ridículo que fez em defesa de um cretino como Zelaya,
um corrupto ligado a grupos somozistas de extermínio e que era tão esquerdista
como Stroessner e democrático quanto Pinochet.
Foi deplorável o papel do
inexpressivo chanceler Patriota (que não se perca pelo nome), saracoteando pelas
ruas de Assunção em desabalada carreira, indo aos partidos Liberal e Colorado
pressionar em favor de um presidente que caia. Adentrando o Parlamento ao lado
do chanceler de Hugo Chávez, o Sr. Maduro, para ameaçar em benefício de um
presidente que o país rejeitava. Indo ao vice-presidente Federico Franco
ameaçar-lhe, com imensa desfaçatez, desconhecendo seu papel constitucional e o
fato de que ninguém renunciaria a nada apenas por uma ameaça calhorda da Unasul
(que não é nada) e outra ameaça não menos calhorda do Mercosul (que não é nada
mais que uma ficção). O Barão do Rio Branco arrancou seus bigodes cofiados no
túmulo profanado pelo Itamaraty de hoje.
O que quer o governo Dilma?
Passar pelo mesmo vexame de Lula na paupérrima Honduras? Se afirmativo, já fica
sabendo que passará. Nós temos imensa disposição de continuar uma parceria que
se revelou positiva e decente para ambos os países. Mas não sentimos ou temos
pela austera presidente o mesmo terror-medo-pânico que lhe devotam seus
auxiliares e ministros. Cara feia não faz história, apenas corrói biografias.
Dilma chamou seu embaixador em Assunção e Cristina fez o mesmo. As radicais
matronas só não sabiam que: o embaixador brasileiro é um ausente total, vivendo
mais tempo em Pindorama do que por aqui. O Embaixador Eduardo Santos é tido no
Paraguay como alguém que acredita que as três melhores coisas em nosso país são
ar condicionado e passagem de volta. Recorda o ex-embaixador Orlando Carbonar,
que foi pego de surpresa em fevereiro de 1989 pelo movimento que derrubou o
general Stroessner. Até meus filhos, crianças na época, sabiam que o golpe se
avizinhava e que estouraria a qualquer momento, menos o embaixador brasileiro,
que descansava no carnaval de Curitiba, sua cidade natal. Voltou às pressas, num
jatinho da FAB, para embarcar Stroessner rumo ao Brasil. E a Argentina... Bem, a
Argentina não tem embaixador no Paraguay faz alguns meses... Ocupadíssima, Dona
Cristina não nomeou seu substituto. País de necrófilos (amam Gardel, Che, Evita
e Maradona, dentre outros defuntos), chamou um embaixador que não existe, um
diplomata fantasma, até a Casa Rosada para consultas.
O Paraguay fez o que tinha que
fazer. Seguirá adiante, como seguem adiante as Nações, testadas e curtidas pelas
crises que retemperam a cidadania e reforçam a nacionalidade. O religioso que
não honrou seus votos de castidade e pobreza e traiu sua igreja, foi por ela
rejeitado. O presidente que não honrou nossos votos e nos traiu, foi por nós
deposto. Deposto por incapaz, por mentiroso, por ineficiente, por desonesto.
Mas, principalmente, por que traiu as esperanças de um país e um povo que
precisaram dele e nele confiaram. E, por isso, Lugo não voltará.
(*) Chiqui Avalos é conhecido
escritor e jornalista paraguaio. Combateu a ditadura de Stroessner e apoiou a
candidatura de Fernando Lugo. É o editor de "Prensa Confidencial", influente
boletim digital editado no Paraguai.
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