Da cena aos bastidores
A política externa do Brasil bem que poderia mostrar mais maturidade e
sofisticação do que transparece de sua atuação nos meandros da crise paraguaia.
Quem sabe, aprendíamos alguma coisa com Mrs. Clinton no affair Honduras, que na
penumbra fez Zelaya desempenhar o papel que interessava aos Estados Unidos,
enquanto o Brasil encenava o personagem equivocado sob o brilho dos holofotes.
Parece não ser o caso. O governo brasileiro insiste em partidarizar a nossa
atuação externa em detrimento do interesse nacional e, com isso, politiza o
Mercosul e mina a credibilidade da precária Unasul. Um Paraguai isolado
certamente não é uma boa solução para o Brasil, muito menos pelo
Brasil.
O Paraguai não é para o Brasil o que o México é para os Estados Unidos. O
Brasil foi apoiador de primeira hora da independência do Paraguai e da sua
integridade territorial, mesmo na tragédia da Guerra da Tríplice Aliança
(1864-1870), “guerra maldita” que encerrou o confronto mais que secular no
Prata. De qualquer forma, nesta Sudamérica não existe o abismo psicossocial que
divide outra América, e a nossa diplomacia faz um jogo complexo na região, cuja
história, geopolítica e cultura conformam um ambiente no qual o Brasil busca
promover estabilidade.
Em função dessa meta, no que diz respeito ao Paraguai, o Brasil tem
duas grandes preocupações, imediatas. A primeira é impedir que a questão dos
brasiguaios extrapole em violência, gerando uma crise bilateral e regional de
consequências imprevisíveis. A segunda é esvaziar qualquer risco de confrontação
armada no país vizinho, o que poderia aspirar o Brasil a uma intervenção ou oportunizar outras, estranhas, que trariam ainda mais
problemas.
Seria muito bom se ficássemos na impertinência do chanceler brasileiro
pressionando o Congresso paraguaio e não prosseguíssemos na tentativa de
intervir num país soberano sem motivo e respaldo. Até mesmo as inoportunas
sanções ao Paraguai que beneficiam Buenos Aires e Caracas merecem ser contextualizadas
no lugar nenhum a que esse eixo vai chegar. Já o atendimento dos interesses
vitais do Brasil na região passa pela manutenção das melhores relações com o
governo paraguaio, algo que não pode ser alterado ao sabor dos ideólogos do
Planalto.
Fatos são criados, porém acontecimentos adquirem sua dinâmica. Tão
bruscamente como se deu a substituição do presidente do Paraguai — golpe para
uns, ruptura para outros — afastaram-se as ameaças à paz e à segurança no país vizinho. Retórica à parte, o resultado é
claro: por ora, os brasiguaios estão menos ameaçados, o risco de uma crise
militar interna foi afastado, e os atores rivais podem ter perdido o
momentum.
Por trás do pano, o Brasil tem razões para estar aliviado. Mas não dá para
comemorar. Melhor seria se voltasse a jogar como sempre ganhou: nos bastidores,
e profissionalmente.
* Sérgio Paulo Muniz Costa, historiador, é membro do CPE (Centro de Pesquisas Estratégicas da UFJF) e do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
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