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terça-feira, 17 de junho de 2014

O palanque e o tribunal

Autor: Sérgio Muniz(*)














A ministra Maria Elizabeth Teixeira Rocha, que assumirá a presidência do Superior Tribunal Militar dia 16, em substituição ao general-de- Exército Raymundo Nonato de Cerqueira Filho, declarou que vai dar publicidade aos arquivos do tribunal referentes ao período da ditadura militar e que é a favor da revisão da anistia à luz dos tratados internacionais, da aceitação de militares homossexuais e da inclusão das mulheres como combatentes do Exército Brasileiro, entremeando uma surpreendente declaração sobre a “diferença” instalada na Justiça mediante os julgamentos procedidos por mulheres.

Oportunizado em clima eleitoral, esse discurso que coincide com a militância ideológica utilizada para mobilizar politicamente as ditas minorias bem que poderia ficar por aí, não fosse sua autora membro da corte incumbida de julgar as apelações e os recursos das decisões dos juízes de primeiro grau da Justiça Militar da União, conforme previsto na Constituição.

Embora a maior parte das declarações da ministra se refira a temas que fogem de sua competência funcional, subjazendo como meras opiniões, algumas delas repercutem diretamente na capacidade do tribunal cumprir a sua função: distribuir justiça.

Afinal, partindo de um magistrado, o principal argumento da Doutora Elizabeth Rocha para rever a Lei da Anistia à luz de tratados internacionais é chocante: passada a necessidade de "forjar esse pacto, esse acordo de transição", ele pode ser revisto.

Que conceito dejustiça sustenta tal relativismo? Qual precedente da História do Brasil serve de amparo a esse revisionismo? Que princípio constitucional pode levar o Brasil a abdicar de sua soberania? Que país pode almejar estabilidade, progresso e paz acicatado pelo discurso da vingança e do arbítrio? Que grau de isenção se pode esperar de julgadores movidos por tais razões? Nenhum!

Ao longo das declarações da ministra subsistem contradições que despertam justificadas preocupações. A primeira delas é o esquecimento da polêmica acerca da divulgação, durante a campanha eleitoral de 2010, dos registros existentes no STM acerca da hoje presidente Dilma Roussef, inacessíveis à imprensa.

Mais grave é a ministra denunciar a diferenciação de cidadãos pela orientação sexual enquanto prega uma justiça de gênero, na qual, supostamente, mulheres julgariam melhor do que os homens. Por fim, repete-se o velho erro de pretender impor-se a todos capacidades iguais a despeito de suas diferenças de gênero, uma perversão da atualidade que prejudica justamente as mulheres.

Entretanto, o mais irônico das declarações da ministra é ela, a título de denunciar o regime militar, exaltar o papel do STM durante aquele período na concessão de habeas corpus, na garantia de liberdade de imprensa, na defesa do direito de greve e na condenação aos excessos no combate à luta armada, assinalando assim a existência, àquela época, das garantias e contrapesos cuja sobrevivência hoje tememos, ameaçados pelo discurso ao qual a ministra se associa.

O palanque chegou aos tribunais. O problema é ele chegar aos quartéis.


(*) Sérgio Paulo Muniz Costa é historiador

2 comentários:

  1. Dá pena ver um 4 estrelas sentado na mesa da posse. A foto está no blog do Noblat. Lembro de uma solenidade numa câmara municipal em que um vereador discursando começou a atacar o que ocorreu em 31 de março de 64. Era aniversário da cidade e havia representação de todas as OM. O Cmt da Gu saiu na hora e todos os que estavam no auditório saíram também. Inclusive vários civis. O general ouviu tudo calado hoje.

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    1. Caro Professor

      Estamos em um Estado democrático e cada um tem direito a defender a sua opinião, independente do nível que ocupa na sociedade, contudo cada um também responde pelas suas palavras e atitudes, pois não adianta discursar e não realizar. As leis estão aí para serem cumpridas. Se for indicar tudo que está no STM sobre o período da Revolução não poderá deixar de fora os atos (ilcitos ou ilicitos) de quem hoje está no governo. Na verdade foi acesso o estopim de uma bomba que não se sabe até onde chegará os estilhaços e quem acendeu deverá fazer o rescaldo. Quanto ao Gen que estava a mesa pode não ter concordado com o que foi dito, mas tem formação democrática para se posicionar como uma autoridade. Sair do evento seria uma atitude de autoritarismo e não é típico de nossas forças, exceto quando estávamos vivendo uma excepcionalidade e que os instrumentos para se mostrar a verdade era apenas pelas atitudes imediatas. Hoje temos outros argumentos e as pessoas que ocupam cargos e causam deslizes são culpadas de suas ações encurtando a presença em sua atividade de autoridade. Estamos aprendendo e com certeza na democracia vamos criar métodos mais eficazes para selecionar as pessoas que nos representam. É momento de muita calma e manter os valores que ainda perduram nas instituições sérias como o Exército Brasilieiro.

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