* Por Rubens Teixeira
Li
um artigo intitulado “A herança da ditadura nos quartéis”, de autoria
de Wadih Damous, ex-presidente da OAB-RJ e hoje presidente da Comissão
Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, que se encerra da seguinte forma:
“Mesmo numa guerra, não é aceitável que militares ‘espanquem o inimigo
até que este morra’, ou que ‘cortem sua cabeça e a joguem no mar’, como
reza a música cantada pelos soldados da PE. Afinal, também os conflitos
armados têm seus códigos e regras. Educar os militares com base em tais
concepções significa prepará-los para o desrespeito às convenções que
regem as guerras. E - ainda pior - para o desrespeito aos direitos
humanos, mesmo em períodos de paz. Por isso, a formação dos militares
deve ser assunto da sociedade como um todo, e não monopólio de viúvas de
uma era tenebrosa que os brasileiros não querem mais de volta. É
preciso reformar e adequar as Forças Armadas à democracia”.
Depois
que li este artigo, fiz algumas reflexões. Como uma instituição que
socorre a sociedade em momentos de crise, que se supera com poucos
recursos em operações de salvamento, e que, em missões internacionais,
tem um histórico ilibado de respeito aos direitos humanos, pode instruir
ou incentivar seus componentes à prática de violações desses direitos? A
sabedoria de Jesus Cristo nos ensinou que é pelos frutos que se conhece
a árvore, não pela maledicência, ou pelas palavras contorcidas ou
envenenadas pelo revanchismo e pelo ódio. Portanto, vamos às verdades
que conheço sobre o Exército e sobre a OAB.
Fiz
dez anos de cursos no Exército, onde segui a carreira regular de
oficial até o posto de capitão. Cheguei ao Exército Brasileiro oriundo
de uma família paupérrima, mas digna. Jamais fui discriminado ou
desrespeitado pela instituição, pois não era parâmetro interno a origem
de cada um de nós, mas sim os resultados e valores. Na AMAN, formei-me
oficial de Infantaria. Jamais aprendi ou fui incentivado a torturar
qualquer pessoa. Fui ensinado e treinado a defender, com a própria vida,
se preciso, a vida e a liberdade do meu povo.
Quando
deixei o serviço ativo do Exército como capitão, superiores,
companheiros e subordinados ficaram tristes. Alguns até constrangidos.
Eu saí triste também. Outros discordaram da minha decisão, mas jamais a
instituição me discriminou. Depois que fiz o IME, fui servir como
engenheiro civil na Amazônia. Nesta ocasião, minha esposa teve um parto
decorrente de uma pré-eclâmpsia grave com desdobramentos que deixaram em
risco a sua vida e a do meu filho recém-nascido. Nestas circunstâncias,
fiz concurso para analista do Banco Central, fui aprovado e tomei posse
no cargo, sendo transferido ex-ofício para a reserva não remunerada.
Em
todas estas etapas, o Exército sempre respeitou meus direitos
fundamentais. Infelizmente, não posso dizer o mesmo da OAB. Fui aprovado
na OAB-RJ, mas, ao requerer minha carteira, deixei de recebê-la por
conta de um recurso do seu então presidente, exatamente o autor do
artigo citado no primeiro parágrafo. Recebi julgamentos cheios de
violações de direitos fundamentais: com cerceamento de defesa, lento e
com quórum bem abaixo do mínimo. Qual o argumento usado pelo presidente
da OAB-RJ? Segundo ele, sendo funcionário de carreira do BACEN, não
poderia ter a referida carteira. A prova da ilegalidade é que a OAB dá a
mesma para servidores do BACEN, formados antes e depois de mim. Dois
pesos e duas medidas, à luz do dia. Coincidência?
Sou contra o Exame da OAB e sempre exteriorizei minha opinião. Sou autor de uma carta de quarenta páginas (disponível no site http://www. rubensteixeira.com.br/)
entregue às autoridades brasileiras argumentando que o citado Exame
fere direitos humanos por ser cercado de inconstitucionalidades,
ilegalidades, inadequações, ser contraditório e favorecer a espoliação
de bacharéis desempregados. Além disso, fere as regras do mercado de
trabalho, a competitividade, limita a justiça aos mais bem aquinhoados,
desrespeita instituições republicanas, fere a isonomia entre as
profissões, é caro, envolto em conflito de interesses, e põe na conta
dos cidadãos, bacharéis em Direito, as fragilidades no sistema de
educação e da fiscalização da OAB. Por isso, viola gravemente direitos
fundamentais.
E
as ações militares? No Exército, há treinamentos que visam simular
situações reais de combate. Aprende-se a lutar em defesa do nosso país e
a defender nosso território de qualquer um que queira dominá-lo. É uma
missão altruística, não de vaidades. Defende-se, em última instância, a
democracia e a soberania de um povo.
As
instituições militares têm a difícil tarefa de preparar profissionais
para enfrentar a morte, a dor, a fome, riscos extremos, sem poder ter
uma prova prática real para aferir o preparo individual ou coletivo. Nas
simulações, não se põe deliberadamente em risco a vida dos
profissionais. O risco existe e é controlado. Trata-se de uma situação
que requer certo grau de agressividade para enfrentar o risco, e, até
mesmo, a morte.
Não
conheço treinamento para a guerra que desconsidere as circunstâncias
reais que acontecem em um combate. Se fora do cenário de confronto, no
dia a dia dos cidadãos, ocorrem cenas dramáticas de violência
lamentáveis, pode-se imaginar o que se passa em um cenário de guerra,
como a morte e ferimento de milhares de combatentes. Não se trata de um
combate dialético, é um conflito onde são empregadas as armas mais
poderosas do momento, cuja tecnologia, muitas vezes, sequer está
acessível ao meio civil.
É
da prática do Exército trabalhar muito e bem, e falar pouco,
comportamento oposto ao de algumas instituições. Por isso, as
organizações militares têm avaliações apreciáveis em pesquisas de
opinião. Queremos saber as verdades históricas sobre as violações de
direitos humanos cometidas, sob qualquer pretexto, em qualquer época, em
nosso país. Todavia, devemos também combater as atuais violações de
direitos. As eventuais vítimas de hoje ainda podem ser preservadas de
violações dos seus direitos ao trabalho, de sua dignidade, de
revanchismos, vinganças, justiçamento por conta de opiniões ou por
qualquer outra discordância. A defesa retórica de direitos humanos deve
ser evidenciada na prática. Do contrário, a hipocrisia destruirá a
reputação de quem defende a democracia com palavras ofuscadas pelos seus
próprios atos.
*
Rubens Teixeira é doutor em Economia (UFF), mestre em Engenharia
Nuclear (IME), Engenheiro Civil (IME), pós-graduado em Auditoria de
Perícia Contábil (UNESA), formado em Direito (UFRJ, e aprovado na
OAB-RJ), bacharel em Ciências Militares (AMAN), professor, escritor,
palestrante e autor da Carta Aberta ao Congresso Nacional pelo fim do
Exame da OAB, disponível no site: http://www. rubensteixeira.com.br/
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