08 Julho 2015 | 03h00
A União de Nações Sul-Americanas
(Unasul) foi constituída dentro dos princípios de integração da
América do Sul, com a fusão das duas grandes uniões existentes no
continente: o Mercado Comum do Sul (Mercosul) e a Comunidade Andina
de Nações. No início de suas atividades com uma visão
mercadológica e aduaneira, a Unasul vem-se transformando numa
instituição intergovernamental que atua nos campos político e
social dos países que a integram.
Ao final de 2008, em cúpula
extraordinária da Unasul, foi instituído, por iniciativa do governo
brasileiro, um Conselho de Defesa, composto pelos ministros de
Defesa dos países integrantes. O conselho é o componente
militar da Unasul, cabendo-lhe prioritariamente a criação conjunta
de políticas de defesa. Outras missões recomendadas, como
intercâmbio de pessoal militar, exercícios operacionais
conjuntos, Forças de Paz da ONU e integração de indústrias de
defesa, vinham sendo realizadas desde a década de 1980.
Entretanto, quanto à citada criação
conjunta – anseio de lideranças que governam a maioria dos países
sul-americanos, especialmente os ditos “bolivarianos” –, não
existia um órgão específico para os estudos e propostas para tal
finalidade. No início do corrente ano, a imprensa brasileira
informou o início das atividades da Escola Sul-Americana de Defesa
(Esude), com sede em Quito, um centro de estudos que representa, em
última análise, um passo efetivo para o pretendido órgão de
elaboração de políticas de defesa e, também, a capacitação de
civis e militares nos assuntos de defesa e segurança regionais.
No período anterior à criação da
Esude não foi observado nenhum debate em nossa sociedade, em nossas
Casas Legislativas e muito menos na área militar. Um processo feito
no mais alto nível governamental, porém às escuras, com
deliberações impostas de cima para baixo, bem à feição das
lideranças que nos governam, o que, sem dúvida, identifica o
modus operandi gramscista do Foro de São Paulo. O escopo estratégico
desse foro é intervir na área militar – principalmente a
brasileira –, o que se está consumando de modo flagrante e abre
caminho para o seu objetivo maior: a América Vermelha.
Segundo assessores do Ministério da
Defesa (MD), a Esud vai gerar uma “confiança mútua” entre os
membros da Unasul. Em bancos e currículos escolares será possível,
mas, por certo, na prática isso não se dará. As nações
ibero-americanas convivem, até os dias atuais, com atritos oriundos
de suas respectivas formações. São conflitos que ainda deixam
marcas em suas sociedades e, aliados ao forte componente emocional
ibérico, poderão ressurgir. Um deles poderá ser o “imperialismo
brasileiro”, ainda latente em alguns países fronteiriços. É bom
lembrar que Simón Bolívar, o líder maior do “bolivarianismo”,
como forma de confrontar o citado imperialismo pregava a integração
da América espanhola. O Mercosul é um exemplo. A preocupação dos
países integrantes é que o “irmão maior” se vai
beneficiar das tratativas comerciais. Talvez o BNDES, com seus
expressivos apoios financeiros aos países latinos, possa reduzir
essa imagem imperialista.
Assessores do MD ainda informam que
a frequência de militares brasileiros em cursos nos Estados Unidos
será reduzida. Uma medida incompreensível e preconceituosa. Parece
que tal redução advém de uma possível doutrinação
americana favorável ao seu regime democrático, diferente da
bolivariana a ser ministrada na Esude, que, por seu turno, não
vê com bons olhos o “Satã do Norte”, como diria Hugo Chávez.
Esse é um sinal claro de como essa escola estará comprometida com a
ideologia bolivariana.
A par desse comprometimento
ideológico, temas curriculares deverão ser considerados, e um deles
será o estudo das personalidades que expressarão simbolicamente a
pretendida integração. Simón Bolívar encabeçará a lista por sua
capital importância para os países de origem espanhola. Estarão
tais temas, sem dúvida, em consonância com a ideologia a adotar
nomes como Fidel Castro, Hugo Chávez, Che Guevara, líderes
indígenas andinos e outros. Não se tem conhecimento de
personalidades históricas brasileiras que apoiaram uma
integração latina.
O governo, para demonstrar
coerência, deveria indicar como personalidade marcante o assessor
especial da Presidência da República para Assuntos
Internacionais, o sr. Marco Aurélio Garcia, um dos fundadores do
Foro de São Paulo, ideólogo confesso das esquerdas e o maior
orientador do PT em integração latina, com liberdade para agir
superior à do Itamaraty – nesse caso, então, um simples
coadjuvante.
Segundo ainda assessores do MD, a
Esude terá um desafio para atingir um “consenso sobre uma
Estratégia de Defesa comum”. Um desafio esdrúxulo e
inexequível, que repercutirá nas doutrinas das Forças Armadas
sul-americanas e em sua soberania. Política Nacional de Defesa e
Estratégia de Defesa são documentos abertos só no Brasil,
país de índole pacifista. Em outros países são documentos
reservados por conterem em grande parte hipóteses de conflitos.
No Brasil, por sinal, os documentos
teóricos em vigor apresentam um enorme hiato entre as teorias
expostas e a prática no preparo e no emprego de suas Forças
Armadas. Elas não poderão cumprir adequadamente a sua missão
constitucional de defesa territorial e salvaguarda da soberania
nacional. O seu poder de dissuasão é limitado e, ano a ano,
seus orçamentos diminuem. Esta situação em que se encontram
poderia ser reduzida por uma ação efetiva do MD, órgão político
de convencimento das autoridades constituídas e do Legislativo
quanto à função e relevância da missão constitucional das
Forças Armadas brasileiras, bem como da cultura dos necessários e
impreteríveis investimentos. Infelizmente, o MD preocupa-se
muito mais em complexas, ineficientes e ideológicas ações, como a
criação de uma Escola de Defesa Sul-Americana, do que se engajar na
solução dos graves problemas que afligem as Forças Armadas
nacionais.
*Rômulo Bini Pereira GEN EX
R/1, foi chefe EM/MD
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