- Sérgio Paulo Muniz Costa
Entre encontros clandestinos e escancarados a República se
despedaça. O escândalo do encontro dos chefes dos poderes Executivo
e Judiciário em Portugal ficou pequeno depois do ocorrido, à luz do
dia e das câmeras, entre o Presidente da Câmara de Deputados e o
Presidente do STF. De escândalo em escândalo, vão se derrubando as
barreiras contra o arbítrio, a soberba e a volúpia dos poderosos.
Acendeu-se a luz vermelha. Ou se estanca a desmoralização da coisa
pública no País ou teremos uma crise nunca vista em nossa História,
estando mais do que na hora de alguém começar a sussurrar nos
ouvidos dos potentados que dominam e saqueiam esta República que o
País não vai se dobrar a eles.
Bastaram mais alguns dias de balbúrdia para que destemperos dignos
de piada se transformassem em agressão aberta à legalidade e à
moralidade no País, com um senador fazendo com que o tribunal
vinculado ao Legislativo investigue a Procuradoria da República que
o investiga e um deputado na chefia do Legislativo conseguindo com
que o juiz que o investiga fosse demandado na esfera do Judiciário.
Assim, autoridades e instituições incumbidas de investigar passam a
ser questionadas, não por que se mostraram ineptas ou abusivas, mas
por que, na verdade, investigam quem se acha acima de qualquer
investigação. É o Brasil passando da judicialização da política
para a judicialização da moral, onde estar certo depende não dos
atos e da sua transparência, mas do poder em confrontar e se impor a
tudo e a todos. Na selva em que o País vai se transformando, as
bananas estão comendo os macacos.
Um pouco da história não tão recente do Brasil pode ajudar a
explicar por que o desastre nacional com o qual estamos flertando
não tem precedentes, na medida em que uma corrupção a serviço de
um projeto de poder está destruindo muito mais do que o balanço de
empresas, as estruturas do equilíbrio fiscal ou a representatividade
política. Não é preciso muito esforço para identificar três
grandes áreas da economia nacional que foram duramente atingidas por
essa degenerescência: petróleo, fomento ao desenvolvimento e
construção pesada, todas três impulsionadas por medidas tomadas há
sessenta ou cinquenta anos que tiraram o Brasil da letargia do
subdesenvolvimento, a saber: a criação da Petrobrás, a fundação
do BNDE e a acumulação de conhecimento e competência das grandes
construtoras brasileiras. Todas três hoje em cheque, sendo
simplesmente impossível pensar que não haverá consequências
gravíssimas disso tudo no futuro do País, caso não haja uma
imediata reversão, de expectativas primeiro, para que haja uma
chance de mudar os rumos.
Só resta relativamente incólume, em parte devido a alguma
descentralização do setor, o agronegócio que sustenta o PIB
nacional, sendo, no entanto, uma temeridade esperar que ele continue
a fazê-lo praticamente sozinho indefinidamente. Ainda que isso fosse
remotamente viável para uma sociedade complexa como a brasileira,
conceber um futuro no qual o País abrisse mão de seu
desenvolvimento para se conformar ao status de nação agrícola
seria um retrocesso que traria implicações até na nossa soberania.
Não é preciso apelar a qualquer exagero para concluir que o Brasil
está se degradando, não apenas seu governo, sua administração
pública e sua economia, mas sua vida social que depende da
viabilidade de sua organização política.
A desfaçatez com que os implicados nos descalabros investem contra
as Instituições deixa claro que estamos diante de um quadro
insólito. Os chefes dos poderes desta República estão todos do
mesmo lado, do lado da impunidade, da continuidade da corrupção e
do desrespeito à Lei, opondo-se, esporadicamente, pelos despojos da
República que depredam. Nenhum deles está cumprindo os seus deveres
para com a sociedade brasileira.
Então se eles têm lado, e contrário ao interesse público, está
traçado o que divide os brasileiros. Seremos todos nós contra todos
eles. Não como o PT que está do lado deles sempre advogou, mas sim
da forma como aqueles que creem no Brasil como uma terra de
liberdade, oportunidade e trabalho, onde vale a pena criar os filhos
e se pode viver sem opressão. Exigiremos que a Lei seja cumprida,
confiaremos nas Instituições e não nos dobraremos ao Poder que não
as respeita e defende. Basta ouvir as ruas, os sermões nas igrejas,
as conversas nas filas e o silêncio das lojas que vão se fechando.
É o que nos coloca do mesmo lado contra todos eles!